JSNEWS (Medford MA) – No dia 9 de outubro, Rueben Antonio Cruz, um residente permanente legal de 60 anos originário de El Salvador, foi abordado por agentes do Serviço de Imigração e Controle de Aduanas dos Estados Unidos (ICE) enquanto conversava com um amigo no bairro de Rogers Park, em Chicago, Illinois. Sem Green Card – o cartão de residência permanente – consigo, Cruz foi retido temporariamente no local, teve seu status verificado por rádio e, ao final, recebeu uma multa de US$ 130 por violar a lei federal que obriga residentes legais a portarem o documento a todo momento. Liberado sem maiores incidentes, o caso de Cruz ilustra um risco cada vez mais palpável em meio à escalada de operações migratórias sob a administração Trump.
Mas o que acontece quando um residente legal, ou até mesmo um cidadão americano, é parado sem provas imediatas de sua condição? A Seção 264(e) da Lei de Imigração e Nacionalidade (INA) é clara: residentes permanentes com mais de 18 anos devem carregar sua Green Card ou equivalente em todos os instantes. A infração é classificada como contravenção menor (misdemeanor), punível com multa de até US$ 100 – valor ajustado para US$ 130 em casos recentes, possivelmente por taxas administrativas – ou prisão por até 30 dias.
Historicamente rara, essa aplicação ganhou fôlego com a “Operação Midway Blitz”, uma série de redadas intensificadas em Chicago desde o início de outubro.
Cruz, que vive de auxílio governamental devido a problemas de saúde, expressou sua frustração: “Não é justo. Eu disse: vamos à minha casa, eu mostro os papéis. Sou residente”. Ele tem 60 dias para pagar a multa ou se apresentar a uma audiência judicial, mas seu status legal permanece intacto.
Contudo, o episódio de Cruz é apenas a ponta do iceberg em um contexto de repressão migratória que não poupa perfis. Sob a segunda gestão Trump, o ICE tem ampliado suas ações, com um aumento de 59% nas prisões em Illinois entre janeiro e julho de 2025 em comparação a 2024, segundo dados do Transactional Records Access Clearinghouse (TRAC). Operações como a de 30 de setembro no complexo de apartamentos South Shore, que resultou na detenção de 37 pessoas e separou crianças cidadãs americanas de seus pais, revelam um padrão alarmante: abordagens baseadas em estereótipos étnicos, sotaques ou presença em bairros de maioria latina.
Relatos de cidadãos americanos detidos por “parecerem” imigrantes – como falar inglês com sotaque, usar espanhol ou trabalhar em empregos manuais – multiplicam-se devido a uma decisão da Suprema Corte em setembro de 2025 que permitiu ao ICE considerar fatores como etnia e linguagem como base para fazer abordagens e fazer questionamentos.
O Risco para Residentes Legais: Da Multa à Detenção Temporária
Para um residente permanente como Cruz, a ausência de documentos pode desencadear uma cascata de consequências. Inicialmente, há a retenção no local para verificação de status via bancos de dados do Departamento de Segurança Interna (DHS). Se confirmada a legalidade rapidamente, como no caso de Cruz, o indivíduo é liberado com uma multa – uma penalidade administrativa que, embora não afete o status imigratório, impõe um ônus financeiro e emocional. No entanto, se a verificação for inconclusiva – por falha técnica, recusa em fornecer dados ou suspeita adicional –, o residente pode ser levado a uma instalação do ICE para interrogatório mais aprofundado. Ali, poderia permanecer por horas ou dias, aguardando confirmação, com acesso limitado a advogados ou familiares.
A prisão formal por até 30 dias é teoricamente possível, mas rara para infrações isoladas como essa. Advogados de imigração, enfatizam que a lei existe há décadas, mas sua aplicação seletiva pode ser considerada uma tática para instilar medo. Em Chicago, epicentro de resistência como “cidade-santuário”, juízes federais impuseram limites em 8 de outubro de 2025, exigindo “causa provável” para prisões sem mandado, após uma decisão da Suprema Corte que, segundo a juíza federal Sharon Johnson Coleman, poderia expor cidadãos e residentes legais a questionamentos baseados em “comunalidades étnicas e linguísticas”.
Quando o Erro Alcança Cidadãos Americanos
O que torna esses momentos particularmente perigosos é a “contaminação” das operações para além dos indocumentados. Cidadãos americanos de origem latina relatam detenções equivocadas por sotaques, aparência física ou proximidade a blitz. Em 30 de setembro, durante a operação South Shore, o veterano militar Rodrick Johnson, cidadão americano, foi arrastado de sua casa, algemado e detido por quase três horas, apesar de suas credenciais. Agentes ignoraram seu pedido por um advogado.
Semelhante foi o caso de Maria Greeley, cidadã de Chicago, cercada no caminho para casa em outubro e algemada por agentes que a confundiram com uma imigrante. Em Waukegan, Illinois, no dia 6 de outubro, Dariana Fajardo, cidadã americana, foi detida apesar de apresentar seu passaporte, sob alegação infundada de obstrução veicular.Esses incidentes não são isolados. Um levantamento da CNN identificou mais de 100 crianças cidadãs americanas separadas de pais detidos em 2025, enquanto a União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU) documenta casos em que latinos – incluindo nascidos nos EUA – são parados por “parecerem hispânicos” ou falarem espanhol.
Uma decisão da Suprema Corte em setembro de 2025 suspendeu uma proibição em Los Angeles contra detenções baseadas em etnia, idioma ou localização, abrindo precedentes nacionais. A dissidência da juíza Sonia Sotomayor alertou para a criação de uma “cidadania de segunda classe”, onde latinos devem carregar “documentação suficiente para provar que merecem andar livremente”.
Dados internos do ICE, obtidos pela CNN, revelam que mais de 75% das pessoas detidas em 2025 não têm condenações criminais além de violações imigratórias ou de trânsito, com apenas 7% por crimes violentos. Isso sugere que o foco em “criminosos perigosos”, prometido pela administração, dá lugar a sweeps amplos, afetando residentes legais e cidadãos.
Uma pesquisa YouGov de outubro de 2025 indica que 60% dos americanos acreditam que o ICE prende cidadãos “frequentemente” ou “às vezes”, com críticas à força excessiva.
Cautela em Tempos Difíceis: Evite Confrontos, Priorize a Segurança
Diante desse cenário, especialistas e defensores de direitos civis, como a ACLU de Illinois, recomendam cautela extrema. A prudência diz: “Os momentos são difíceis, e o confronto só agrava riscos”. Para residentes legais: carregue sempre a Green Card ou memorize seu número de registro (A-number) para agilizar verificações.
Cidadãos latinos, mesmo sem obrigação legal, optam por portar passaportes ou certidões de nascimento, como relatado por ativistas do Arizona.
Evite áreas de Blitz conhecidas e coopere calmamente durante abordagens – resistir pode escalar para acusações de obstrução. Não se trata de paranoia, mas de sobrevivência. Como Elzon Lemus, um cidadão detido brevemente em Nova York por sua “pele escura e sotaque”, declarou: “Por causa da cor da pele, do sotaque ou da etnia, exigem papéis sem motivo”.
Em Chicago, o debate sobre o equilíbrio entre segurança pública e direitos constitucionais ganha urgência. Enquanto o ICE nega deturpações sistemáticas, afirmando que “não prende cidadãos”, os relatos e dados contam outra história. A cidade que acolheu ondas de imigrantes agora navega um mar de incertezas, onde um sotaque ou uma rua errada pode transformar uma rotina em pesadelo.