Eliana Pereira Ignacio
Olá, meus caros leitores, depois que as festas natalinas passam, algo muda de forma quase imperceptível. As luzes se apagam, os encontros diminuem, a rotina retorna, e com ela surgem silêncios que antes eram preenchidos por celebrações, expectativas e movimento. É justamente nesse intervalo — entre o que foi vivido e o que ainda virá — que a paz revela sua verdadeira natureza. Se ela depende apenas de momentos especiais, então é frágil. Mas se ela permanece após as festas, ela se torna escolha, caminho e postura diante da vida.
Do ponto de vista psicológico, esse período pós-festas costuma ser delicado. O cérebro humano responde intensamente a estímulos emocionais positivos, como encontros familiares, simbolismos, esperança e pertencimento. Quando esses estímulos cessam, muitas pessoas experimentam queda de humor, irritabilidade ou sensação de vazio.
A psicologia explica que isso não significa ingratidão ou fraqueza, mas uma adaptação natural do sistema emocional. A questão central não é sentir essa oscilação, mas o que fazemos com ela. A paz, nesse contexto, não é ausência de emoções difíceis, mas a capacidade de não se deixar governar por elas. A terapia cognitivo-comportamental nos ensina que emoções são influenciadas pela forma como interpretamos nossas experiências.
Aaron Beck destacou que pensamentos automáticos negativos — como catastrofização, rigidez e autocrítica excessiva — alimentam estados internos de inquietação. Escolher a paz, portanto, é aprender a questionar pensamentos que roubam a serenidade e substituí-los por percepções mais realistas, compassivas e equilibradas. Após as festas, é comum surgir uma pressão silenciosa: o novo ano exige mudanças, metas, resultados. “Agora preciso fazer dar certo”, “não posso errar de novo”, “esse ano tem que ser diferente”. Esse discurso interno, embora socialmente incentivado, frequentemente nasce da ansiedade, não da paz.
A psicologia chama isso de motivação baseada no medo, que tende a gerar exaustão emocional e frustração. Em contraste, pesquisas sobre autocompaixão mostram que pessoas que se tratam com gentileza, reconhecendo limites e processos, apresentam maior constância emocional e saúde mental ao longo do tempo (Ne , 2011). Escolher a paz diariamente não significa desistir de crescer, mas mudar o ponto de partida do crescimento.
Crescer a partir do cuidado, não da cobrança. Avançar a partir do propósito, não da comparação. Essa escolha interna transforma a forma como lidamos com falhas, conflitos e frustrações inevitáveis da vida cotidiana. No campo espiritual, essa compreensão encontra eco profundo no Evangelho. Jesus não promete uma vida sem aflições, mas oferece uma paz que sustenta no meio delas. É uma paz que não depende das circunstâncias externas, mas de uma confiança interna. Psicologicamente, isso se traduz na capacidade de tolerar imperfeições sem entrar em desorganização emocional.
Espiritualmente, é descansar na certeza de que não precisamos controlar tudo para estarmos seguros. Após o Natal, a vida real retorna com suas demandas: trabalho, família, responsabilidades, conflitos relacionais. É nesse cenário comum que a paz é testada e, ao mesmo tempo, fortalecida.
A neurociência mostra que o cérebro tende a repetir padrões antigos diante do estresse. Por isso, a paz precisa ser praticada. Pequenas escolhas diárias — pausar antes de reagir, respirar conscientemente, refletir, orar, agradecer — ajudam o sistema nervoso a sair do modo de ameaça e entrar em um estado de maior equilíbrio emocional (Siegel, 2012). A paz como escolha diária também impacta profundamente os relacionamentos. Pessoas em paz não são aquelas que evitam conflitos a qualquer custo, mas aquelas que aprendem a se posicionar sem agressividade e a estabelecer limites sem culpa.
Carl Rogers afirmava que relações saudáveis se constroem quando há congruência, empatia e aceitação — qualidades que ‑ oferecem em um coração pacificado, não em um coração defensivo. Talvez o maior desafio após as festas seja aceitar que a vida não precisa ser extraordinária todos os dias para ser significativa. A paz se manifesta no ordinário: na forma como falamos, ouvimos, reagimos e escolhemos continuar.
Às vezes, o verdadeiro recomeço não está em mudar tudo, mas em responder de forma diferente às mesmas situações. Que neste tempo pós-festas possamos compreender que a paz vivida no Natal não termina com o calendário. Ela amadurece na constância, se fortalece na prática e se aprofunda quando escolhemos, dia após dia, viver com mais presença, menos rigidez e mais confiança.
Porque quando a paz se torna uma escolha diária, ela deixa de ser um sentimento passageiro e passa a ser um modo de existir.
“A paz de Deus, que excede todo entendimento, guardará os vossos corações e as vossas mentes em Cristo Jesus.”
(Filipenses 4:7) Feliz Natal!!
Até a próxima !
Eliana Pereira Ignacio é Psicóloga, formada pela PUC – Pontifícia Universidade Católica – com ênfase em Intervenções Psicossociais e Psicoterapêuticas no Campo da Saúde e na Área Jurídica; especializada em Dependência Química pela UNIFESP Escola Paulista de Medicina em São Paulo Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas, entre outras qualificações. Mora em Massachusetts e dá aula na Dardah University. Para interagir com Eliana envie um e-mail para epignacio_vo@hotmail.com ou info@jornaldossportsusa.com


