
Medford (MA), 30 de setembro de 2025
No dia 29 de setembro de 2025, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, apresentou na Casa Branca, ao lado do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, uma proposta ambiciosa de 20 pontos para encerrar a guerra em Gaza, que já dura quase dois anos e deixou um rastro de devastação: mais de 66 mil mortos palestinos, 1.139 israelenses e uma crise humanitária sem precedentes. O plano, que promete cessar-fogo imediato, liberação de reféns, desarmamento do Hamas e reconstrução de Gaza como uma “Nova Gaza” sob supervisão internacional, foi recebido com apoio entusiasmado de Israel e de países árabes como Qatar, Egito e Arábia Saudita. No entanto, o silêncio do Hamas, que considera o plano uma “rendição” pró-Israel, lança dúvidas sobre sua viabilidade. Mais do que isso, a proposta expõe uma verdade incômoda: talvez nenhum dos lados realmente deseje a paz, pois o conflito serve como um poderoso unificador interno, alimentado por narrativas de inimigos externos que ecoam não só em Israel e Gaza, mas também em atores globais, do Irã ao progressismo ocidental.
O Plano de Trump: Um Ultimato Disfarçado de Paz
A proposta de Trump, detalhada em um documento oficial da Casa Branca, exige a liberação de todos os reféns (vivos e mortos) em 72 horas em troca de 250 prisioneiros palestinos com penas perpétuas e 1.700 detidos desde outubro de 2023. O Hamas deve depor armas, renunciar ao governo de Gaza e aceitar uma “convivência pacífica”, com anistia para membros que concordarem e “passagem segura” para outros. Uma Força Internacional de Estabilização (ISF), composta por países árabes e muçulmanos, desarmaria o grupo, enquanto Israel manteria um “perímetro de segurança” indefinido. Um “Conselho de Paz”, liderado por Trump e figuras como Tony Blair, supervisionaria uma administração tecnocrática até que a Autoridade Palestina (AP) complete reformas.
A reconstrução de Gaza, com foco em empregos e desenvolvimento econômico, é vendida como uma “Riviera do Oriente Médio”. Netanyahu saudou o plano como uma “nova era” que garante que Gaza “nunca mais ameace Israel”.
Países como Qatar, Jordânia, Emirados Árabes, Arábia Saudita, Egito, Indonésia, Paquistão e Turquia emitiram uma declaração conjunta apoiando os “esforços sinceros” de Trump. Líderes internacionais, como Emmanuel Macron (França), Giorgia Meloni (Itália) e até o Kremlin, expressaram apoio cauteloso. A Autoridade Palestina também elogiou os “esforços determinados”, mas pediu reformas. No entanto, o Hamas, consultando mediadores no Qatar, considera o plano “impossível”, por exigir desarmamento e perda de controle sem garantias de soberania. Um oficial palestino falando à Al Jazeera chamou-o de “adoção total das condições israelenses”. No X, vozes como a deputada americana Rashida Tlaib afirmam que “Trump e Netanyahu não decidem o futuro de Gaza; os palestinos sim”.
A Guerra Como Unificador: Israel e Hamas Precisam do Conflito?
O ceticismo sobre o plano de Trump não vem apenas de suas lacunas – ausência de cronograma para retirada israelense e de um caminho claro para um estado palestino –, mas de uma dinâmica mais profunda: a guerra unifica Israel e Hamas, reforçando narrativas de inimigos externos que sustentam suas lideranças.
Em Israel, Netanyahu, desgastado por escândalos de corrupção e protestos contra reformas judiciais, viu sua popularidade crescer durante a guerra, com 68% dos israelenses apoiando ações contra o Hamas, segundo o Israel Democracy Institute. O ataque de 7 de outubro de 2023, que matou 1.139 civis e sequestrou 250, uniu até opositores em torno da “segurança nacional”. O plano de Trump, que favorece Israel com controle de segurança indefinido, permite que Netanyahu mantenha sua base de direita sem concessões impopulares, como um estado palestino.
Para o Hamas, a guerra é a espinha dorsal de sua identidade como “resistência”. Governando Gaza desde 2007, o grupo enfrenta críticas internas por corrupção e pela crise humanitária (90% da população deslocada, segundo a ONU). Rejeitar o plano de Trump, que exige desarmamento e renúncia ao poder, reforça sua narrativa de luta contra a “ocupação sionista”.
Declarações de líderes como Ismail Haniyeh, no Qatar, chamam a guerra de “genocídio” e priorizam a retirada total das Forças de Defesa de Israel (IDF). No X, posts de apoiadores palestinos ecoam que o plano é um “manual colonial”. Prolongar o conflito mantém o Hamas relevante, com apoio de Irã e Qatar, mesmo ao custo de mais sofrimento em Gaza.
Atores Globais: Um Mundo que Não Quer a Paz?
A polarização do conflito se estende além de Israel e Hamas, com atores internacionais reforçando narrativas que dificultam a paz. O Irã, principal financiador do Hamas e do Hezbollah, rejeita o plano de Trump como uma violação dos direitos palestinos, segundo o chanceler Abbas Araghchi. Para Teerã, o conflito mantém sua influência regional, usando proxies como o Hamas para contrapor Israel e os EUA.
O fundamentalismo islâmico, em países como Síria e Iêmen, também se alimenta da retórica anti-Israel, unificando grupos sob a bandeira da “jihad”.
No Ocidente, a divisão é igualmente clara. Progressistas e socialistas, do Brasil aos EUA, condenam Israel como “estado colonial” e “genocida”. No Brasil, figuras como Guilherme Boulos e movimentos como o MST frequentemente criticam Israel, alinhando-se à causa palestina. Nos EUA, deputados como Rashida Tlaib e ativistas no X chamam o plano de Trump de “armadilha” para anexar a Cisjordânia.
Por outro lado, a direita, especialmente nos EUA, condena o Hamas como terrorista e apoia Israel incondicionalmente. No X, vozes como Tiffany Smiley elogiam Trump como “presidente da paz”, mas exigem a destruição do Hamas. Essa polarização global transforma Gaza em um palco ideológico, onde a paz é secundária às agendas políticas.
Um Acordo Condenado?
O plano de Trump, embora ambicioso, parece mais um ultimato do que um acordo equilibrado. Sem concessões como retirada israelense ou soberania palestina, é improvável que o Hamas aceite, especialmente após rejeitar propostas semelhantes em 2024-2025. Trump ameaçou apoiar Israel para “terminar o trabalho” em caso de recusa, o que pode escalar a guerra, com mais bombardeios e vítimas.
Mediadores como Qatar e Egito tentam construir pontes, mas o prazo de “3-4 dias” dado por Trump expira em breve, e analistas preveem impasse. A guerra, com seus 66 mil mortos palestinos e 168 mil feridos, unifica Israel e Hamas ao desviar atenções de crises internas e reforçar narrativas de resistência. Globalmente, atores como o Irã, progressistas e direitistas transformam o conflito em uma batalha ideológica, onde a paz é um discurso conveniente, mas não uma prioridade. O mundo não quer paz em Gaza; quer vitórias morais. Sem reconhecimento mútuo e pressão internacional neutra, o plano de Trump pode se tornar mais um capítulo de um conflito que, tragicamente, parece servir a todos os lados – exceto às vítimas.