Por: Agência O Globo – O casal colombiano Gladys, de 55 anos, e Nelson Gonzalez, de 60, foi deportado pelo governo dos Estados Unidos na semana passada. Morando no há quase 40 anos, eles foram presos e algemados durante uma visita de rotina ao Serviço de Imigração e Controle de Alfândega (ICE), em 21 de fevereiro. Colocados sob custódia federal, permaneceram detidos por três semanas antes de serem enviados para a Colômbia.
Segundo uma declaração do ICE, Gladys e Nelson chegaram aos Estados Unidos sem autorização em 1989, fugindo da violência na Colômbia. Embora não tivessem visto, puderam solicitar asilo. No entanto, em 2000, o tribunal de imigração determinou que não havia base legal para que o casal permanecesse no país e emitiu uma ordem de saída voluntária, que permite que a pessoa deixe os EUA por conta própria, evitando assim uma ordem formal de deportação.
Em entrevista à CNN, a advogada de imigração Monica Crooms, que começou a representar os Gonzalez em 2018, afirmou que o casal não saiu dos Estados Unidos devido à orientação equivocada de seu advogado da época. Segundo ela, o profissional os induziu a acreditar que a decisão poderia ser apelada e que havia chances de legalização.
— Após consultar outros advogados, eles rapidamente perceberam que estavam em uma situação muito precária em relação ao seu status de imigração — disse Crooms. — Eles gastaram milhares de dólares em aconselhamento jurídico ao longo dos anos, e alguns dos profissionais que contrataram nem sequer eram advogados de imigração.
Ainda segundo a advogada, os Gonzalez tentaram legalizar sua situação dentro das possibilidades disponíveis nos anos 90.
— Infelizmente, eles foram vítimas de práticas predatórias de imigração, que eram bastante comuns naquela época — acrescentou.
Em comunicado, o ICE afirmou que Gladys e Nelson esgotaram “todas as opções legais para permanecer nos EUA entre março de 2000 e agosto de 2021”, incluindo revisões da Junta de Apelações de Imigração em 2001 e 2018, do Serviço de Cidadania e Imigração em 2010 e do Tribunal de Apelações do 9º Circuito dos EUA em 2021.
— Por duas décadas, o casal permaneceu sob uma ordem de supervisão — explicou Crooms.
Esse programa, administrado pelo Departamento de Segurança Interna, permite que pessoas com ordens de remoção fiquem nos EUA temporariamente, desde que realizem check-ins periódicos enquanto se preparam para deixar o país.
— O oficial de deportação responsável pelo caso não havia pressionado para que eles partissem até 2018, quando informou que era hora de deixar o país caso seu status não pudesse ser legalizado — concluiu a advogada.
Uma de suas filhas, Stephanie Gonzalez, compartilhou uma mensagem na página GoFundMe em que defendia os pais. Stephanie alega que por quase quatro décadas, eles “construíram uma vida” nos EUA, “criando três filhas, contribuindo para sua comunidade e, recentemente, recebendo seu primeiro neto”.
— Agora, estão sendo tratados como criminosos — escreveu ela para a CNN.
Stephanie, que, assim como suas duas irmãs, nasceu na Califórnia, relatou que os pais fugiram da Colômbia temendo por suas vidas.
— Na época em que meus pais deixaram Bogotá, a cidade e o país eram conhecidos como a capital mundial do assassinato — disse Stephanie. — Eles fugiram da violência desenfreada das drogas que eram forçados a viver.
Após solicitar asilo, Nelson e sua esposa foram vítimas de um esquema de fraude migratória conduzido por seu primeiro advogado, afirmou a filha do casal à CNN.
— O primeiro ‘advogado’ deles nem sequer era um advogado de verdade. Ele pegou o dinheiro dos meus pais e, pouco depois, seu escritório foi fechado por conta de uma investigação criminal — disse Stephanie.
Ela explicou que, entre o final dos anos 1980 e o início dos anos 1990, fraudes na área de imigração eram comuns, e os advogados que seus pais contrataram depois acabaram sendo desqualificados.
— Obter a cidadania é um processo difícil, e eles tiveram apenas uma chance para corrigir a papelada preenchida de forma errada por esse falso advogado — complementa.
Nos últimos 25 anos, Nelson e Gladys recorreram repetidamente à Justiça em busca de uma nova oportunidade, alegando que foram prejudicados por uma “assistência jurídica ineficaz”, acrescentou a filha do casal.
Segundo a legislação de imigração dos EUA, imigrantes que vivem no país ilegalmente podem tomar medidas legais para evitar a deportação, informou o ICE.
“No entanto, uma vez esgotados todos os recursos e apelações, esses indivíduos permanecem sujeitos a uma ordem final de remoção emitida por um juiz de imigração, e o ICE tem a obrigação de cumpri-la”, declarou a agência.
Ainda assim, a filha do casal e a advogada afirmam que os Gonzalezes foram tratados injustamente durante o processo de deportação.
— Meus pais amavam este país, sacrificaram tudo o que tinham para tentar obter a cidadania, mas foram traídos pelo sistema — disse Stephanie à CNN. — No pior dos cenários, eles deveriam ao menos ter tido a dignidade de organizar suas coisas e retornar por conta própria a um país onde não vivem desde os anos 1980. Em vez disso, foram jogados em um centro de detenção — que nada mais é do que uma prisão com outro nome — sem qualquer previsão de quando seriam libertados.
Gladys e Nelson permaneceram sob custódia do ICE por cerca de três semanas, transferidos entre centros de detenção na Califórnia, no Arizona e na Louisiana, segundo a advogada Mônica Crooms. O processo de deportação foi parcialmente adiado devido a um erro do governo.
— O Departamento de Segurança Interna perdeu os passaportes deles — afirmou Crooms. — Para que a remoção fosse concluída, o governo colombiano precisou emitir novos documentos de viagem.
As filhas do casal ainda têm esperança de que seus pais possam retornar aos Estados Unidos um dia, disse Stephanie. No momento, a prioridade da família é ajudar Gladys e Nelson a se adaptarem à vida na Colômbia.
— Conseguimos arrecadar US$ 65 mil para reconstruir suas vidas, mas também para pagar os melhores advogados, para que um dia possam voltar — disse.
No entanto, devido a uma lei de 1996, o casal não poderá retornar aos EUA por pelo menos 10 anos. A norma determina que qualquer pessoa que tenha permanecido ilegalmente no país por um ano ou mais, sem cumprir uma ordem de saída voluntária, está sujeita a essa restrição, disse Crooms.
— Acredito que eles poderão voltar, mas não vejo isso acontecendo nos próximos 10 anos — disse a advogada. — Se houver uma mudança significativa na lei de imigração, então tudo pode mudar.
Desde 2018, Crooms acompanhava o casal em suas apresentações anuais às autoridades de imigração. No entanto, este ano, eles não pediram sua presença.
— Se tivessem me ligado, eu os teria aconselhado a se preparar para a saída e a organizar seus assuntos, dado o cenário atual da imigração — afirmou. — Qualquer pessoa sob uma ordem de supervisão, que precise se apresentar regularmente, deve considerar a possibilidade real de ser detida e deportada.
Ela também recomendou cautela a imigrantes indocumentados e residentes permanentes ao viajar.
A advogada e Stephanie ressaltaram que a repressão do governo Trump às violações das leis de imigração continuará afetando não apenas imigrantes como Gladys e Nelson, mas também cidadãos americanos de minorias e imigrantes que vivem legalmente nos Estados Unidos.
— A quantidade de pessoas sendo detidas e colocadas nesses centros é absolutamente de partir o coração — disse Stephanie. — Espero que este governo perceba o impacto devastador que isso terá em tantas famílias americanas.