JSNEws – Melanie Krause, comissária interina do Serviço de Receita Federal dos Estados Unidos (IRS), está renunciando ao cargo em protesto contra um acordo que prevê o compartilhamento de dados fiscais de imigrantes com o Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas (ICE). O objetivo do pacto é identificar e deportar indivíduos em situação irregular no país, conforme informou a agência Associated Press (AP).
Krause, que assumiu a liderança interina da agência em fevereiro deste ano, decidiu deixar o posto após a assinatura, na segunda-feira, 7 de abril, de um documento de compartilhamento de dados pelos secretários do Tesouro, Scott Bessent, e de Segurança Interna, Kristi Noem.
O acordo autoriza o ICE a enviar nomes e endereços de imigrantes sem documentação legal ao IRS, que os cruzará com seus registros fiscais para verificação. O IRS atravessa um período de instabilidade devido a decisões da administração Trump de expor informações de contribuintes. Em fevereiro, o então comissário interino Douglas O’Donnell anunciou sua aposentadoria após cerca de 40 anos de serviço, em meio a controvérsias sobre o acesso do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), liderado por Elon Musk, a dados fiscais da agência.
Krause assumiu o comando logo após sua saída. Mais recentemente, o conselheiro-chefe interino, William Paul, foi substituído no último mês por Andrew De Mello, advogado do escritório do conselheiro-chefe visto como alinhado ao DOGE, segundo duas fontes que falaram sob anonimato.
Contexto do Acordo
O Departamento do Tesouro argumenta que o acordo com o ICE é um instrumento para cumprir a agenda do presidente Donald Trump de fortalecer a segurança nas fronteiras, inserindo-se em uma ampla repressão imigratória que já resultou em deportações, operações em locais de trabalho e até no uso de uma lei de guerra do século XVIII para expulsar migrantes venezuelanos. Um oficial do Tesouro, sob condição de anonimato, afirmou que o pacto se fundamenta em “autoridades de longa data concedidas pelo Congresso”, destinadas a proteger a privacidade de cidadãos cumpridores da lei enquanto facilitam a persecução de criminosos.
Por outro lado, defensores dos direitos dos imigrantes sustentam que o acordo entre o IRS e o Departamento de Segurança Interna (DHS) infringe leis de privacidade e compromete a proteção de todos os americanos. Tom Bowman, do Centro para Democracia e Tecnologia, alertou que a divulgação de registros fiscais de imigrantes para fins de controle imigratório “desestimulará a conformidade tributária entre comunidades imigrantes, reduzirá contribuições a programas públicos essenciais e elevará os encargos para cidadãos americanos e outros contribuintes”. Ele destacou ainda que a medida estabelece um precedente perigoso para abusos de privacidade em outros programas federais.
Todd Lyons, diretor interino do ICE, declarou na terça-feira, 8 de abril, durante a Expo de Segurança de Fronteiras em Phoenix, que o acordo auxiliará na identificação de pessoas que recebem benefícios indevidos e estão “meio que se escondendo à vista de todos” – uma expressão idiomática que sugere estarem visíveis, mas despercebidas – ao usar identidades falsas para evitar detecção.
Críticas e Implicações Legais
Na segunda-feira, 7 de abril, especialistas do Centro de Direito Tributário da Universidade de Nova York (NYU) advertiram que o acordo “ameaça violar direitos assegurados por leis antigas que protegem informações fiscais contra divulgação indevida”. Eles argumentam que é difícil conceber como o IRS poderia compartilhar dados com o DHS sem desrespeitar os estatutos de privacidade dos contribuintes, o que poderia expor oficiais a sanções civis e criminais. O memorando oficial, contudo, assegura que IRS e ICE conduzirão suas ações de modo a “reconhecer e reforçar o direito à privacidade dos indivíduos”, em conformidade com leis, regulamentos e boas práticas administrativas.
A renúncia de Krause reflete o dilema ético e legal suscitado pelo acordo, evidenciando as tensões entre as políticas de imigração e a proteção de dados. A medida coloca em risco as estruturas de privacidade que sustentam o sistema tributário americano, levantando questionamentos sobre os limites entre segurança nacional e direitos individuais.