JSNEWS – Em 27 de junho deste ano as autoridades policiais descobriram um caminhão baú abandonado nos arredores de San Antonio, no estado americano do Texas, cheio de pessoas que morreram quando tentavam entrar ilegalmente nos Estados Unidos vindos do México e de outros países da América Central, ao todo, cinquenta e três imigrantes morreriam na tragédia.
Foi o pior incidente desse tipo na história dos EUA e um sinal de como as coisas mudaram na fronteira sul nos últimos anos: o contrabando transfronteiriço de pessoas passou de um negócio fragmentado que envolvia um número pequeno contraventores para um mercado promissor e que, de acordo de acordo com o Departamento de Segurança Interna dos USA (DHS), é controlada pelo crime organizado e gera mais de 13 bilhões de dólares por ano.
O incidente de San Antonio mostrou alguns sinais do regime de contrabando, de como ele é feito e dos perigos nele envolvidos.
Os indocumentados que estavam dentro daquele caminhão vieram do México, Honduras, Guatemala e El Salvador, de acordo com seus respectivos governos.
Muitos pagaram entre US$ 3.000 e US$ 8.500 ao Cartel del Noreste, um grupo do crime organizado, pelo transporte entre as cidades de Camargo e Nuevo Laredo, no México, para um ponto de entrega em San Antonio, em território americano, a informação é da VICE News, citando duas pessoas diretamente familiarizadas com o negócio.
Os contrabandistas prometeram aos migrantes e sua família uma “garantia de três meses” e “três meses de tentativas”, de acordo com registros de chat do WhatsApp.
As autoridades acreditam que o grupo foi então colocado em um caminhão com um número de identificação “clonado” que corresponde a uma transportadora legitima. Os imigrantes foram mantido em um esconderijo e posterirormente “contrabandeados” através de um posto de controle da Patrulha de Fronteira dos EUA em Laredo, Texas, sem incidentes, antes do grupo ser deixado em San Antonio, no Texas.
O negócio do contrabando humano cresceu nos últimos anos, à medida que inúmeros fatores estruturais que vão da pobreza à mudança climática à violência de gangues empurram os imigrantes para o norte, mesmo que os EUA tenham reforçado cada vez mais o acesso ao seu sistema de imigração, especialmente durante o governo Tump.
Segundo dados do governo dos USA, mais de 5.046 pessoas foram presas por contrabando no ano passado, quase o dobro do total em 2014. O negócio de contrabando agora ganha US$ 13 bilhões por ano, acima dos US$ 500 milhões em 2018, à medida que cartéis de drogas assumiram o controle do contrabando que eram feitos por “coiotes” independentes que costumavam guiar grupos através da fronteira.
O negócio do contrabando tornou-se especialmente lucrativo durante a pandemia graças a políticas como a diretiva de saúde pública title 42, uma ordem da era Trump que autoriza os funcionários da fronteira a afastar a maioria dos cruzadores de fronteira imediatamente sob o pretexto da pandemia.
O governo Biden tentou acabar com a política, que críticos dizem negar aos migrantes seus direitos legalmente protegidos de busca de asilo, mas a Casa Branca tem sido prejudicada por decisões em tribunais federais.
Como resultado, os cruzadores de fronteira frequentemente fazem repetidas tentativas de atravessar para os EUA, criando ainda mais demanda por contrabandistas até que esses fatores motivadores da imigração ilegal cessem, as pessoas continuarão vindo para os EUA de modo ilegal.
“Nunca haverá um ponto de segurança que possibilite aos EUA impedirem completamente o fluxo ilegal de pessoas na fronteira”, disse jessica Bolter, do Instituto de Política migratória, ao The Independent. “Os fatores ambientais e de segurança que estão levando as pessoas a saírem de seus países, bem como os fatores de pressão econômica — sempre haverá razões para migrar.”
Isso levou grupos como o Cartel do Golfo do México a intervir, trazendo uma eficiência implacável a um negócio já perigoso para os imigrantes envolvidos.
Usando os recursos dos cartéis, os contrabandistas agora usam pulseiras de identificação para classificar pessoas, usam aplicativos de mensagem para orientar seus agentes a movimentar essa pessoas, prede-los, solicitar resgate ou, se necessário, ordenar a uma execução.
“Eles estão organizando a mercadoria de maneiras que você nunca poderia imaginar cinco ou dez anos atrás”, disse Guadalupe Correa-Cabrera, especialista em contrabando na Universidade George Mason, ao The New York Times.
Teófilo Valencia, do México, disse à Associated Press que pegou um empréstimo dando a casa de sua família como garantia para pagar US$ 10.000 a contrabandistas para trazer seus dois filhos adolescentes para os EUA, antes de morrerem na tragédia de San Antonio.
Mesmo com o aumento do contrabando humano e do grau de sofisticação alcançado pelos cartéis do crime, não há garantia de passagem segura para os imigrantes que buscam uma vida melhor na América.
Se os membros da família não puderem pagar totalmente contrabandistas, os migrantes podem ser mantidos em esconderijos e sujeitos a tortura e violência sexual ou serem mortos. Aqueles que são transportados com sucesso muitas vezes enfrentam o mesmo tipo de condições angustiantes que os migrantes mortos em San Antonio experimentaram.
Em março, agentes de fronteira perto de El Paso encontraram 34 migrantes escondidos em dois contêineres de carga sem ventilação. Um mês depois, as autoridades encontraram 24 mantidos em cativeiro em um esconderijo.
O governo Biden lentamente tentou reverter algumas das políticas de imigração linha-dura do governo Trump, e essas tentativas, por mais bem vista que sejam pelos defensores dos direitos dos imigrantes, elas também são vistas como um incentivo a imigração ilegal.