Edel Holz – No início, ele a levava todo fim de semana pra jantar e a cobria de flores e presentes. Nem sombra de ser muquirana.
No início, ela não reclamava de nadica de nada, era alegre, positiva e não gastava à toa. Lá no início, o sexo entre eles era feijão com arroz tinha todo dia. Depois, virou missa dominical, uma vez por semana, engatando com salário-mínimo (trepada mensal).
Hoje em dia, é filet mignon- uma vez na vida e olhe lá! E ninguém faz questão de transar.
É relevante. No início, eles viajavam muito sem dia de voltar e quase não brigavam.
No início, ela não tomava remédio controlado e ele não tinha nem dor de cabeça. Ah o início… mas onde foi que eles se perderam?
Quando foi que aquele fogo parou de queimar?
Que o tesão parou de gritar?
Que o amor anda era amor e não tinha ainda virado outra coisa?
Quando foi?
Como foi?
Foram os boletos que não paravam de chegar?
Os filhos dando trabalho desde que nasceram?
A ausência de sonhos?
O choque da realidade?
Quem é o culpado?
Cadê o riso solto, a vontade de estar junto, o desejo do beijo, de dormir de conchinha? Antes só que mal acompanhado, diz o ditado. E o medo da separação?
E o pavor da solidão?
Existe uma solução?
Ele joga seu joguinho e vive no seu mundinho, enquanto ela conversa pelo face time com três amigas de uma vez. Falam de tudo. Fofocam, trocam receitas, comentam sobre os grupos das famílias do zap e claro falam sobre os filhos! As outras elogiam os maridos- que ganharam um carro, uma joia, que viajaram numa segunda lua de mel… E ela calada, só ouve a felicidade das amigas que estampam as redes sociais. O marido, sai com os amigos, que estão todos solteiros, curtindo a vida adoidado e ele pensa com pesar na volta pra casa.
Ele chega e ela jantando sozinha.
Os 4 filhos foram pra balada. As amigas devem estar curtindo seus maridos perfeitos. Ele vai até a cozinha, se serve e senta- se em frente à ela, nessa mesa de oito lugares. Nenhuma palavra, nem se olham.
Ela:- Como foi seu dia?
Ele:- Normal. E o seu?
Ela: Um saco. Cansei. Quero a separação. Se sentiu superior, tendo a iniciativa que nunca teve.
Ele se engasgando com a comida e disse: Tem certeza? Semana que vem faremos 30 anos de casados.
Ela: Conto até o quinto ano. Quando éramos felizes.
Ele: Você não é feliz comigo?
Ela: Não. E você é?
Ele: Então viveu ao meu lado 25 anos infeliz? Pensei que me amava…você tem outro?
Ela: Não. E você tem?
Ele: Outro não. sou macho!
Ela: E outraaaa… vc tem?
Ele:- E se tiver… te interessa?
Ela: Não mesmo. Perguntei por que perguntou! Quando trataremos do divórcio?
Ele: O mais rápido possível (pensando nos amigos divorciados e livres como gatos)
Ela: Aguardo! Pensando numa viagem erótica com um homem mais novo numa ilha paradisíaca. Cada um colocou por vez seu prato na dish washer.
Foram pro quarto, deitaram-se na mesma cama que dormem há 30 anos, viraram-se de bunda um pro outro e dormiram.
Amanhã será um novo dia!
SOBRE A COLUNISTA: Edel Holz é a mais premiada e consagrada atriz, roteirista, diretora e produtora teatral brasileira nos Estados Unidos. Inquieta e de mente profícua, Edel tem sempre um projeto cultural engatilhado para oferecer para a comunidade brasileira. Depois de anos de ausência, Edel volta a abrilhantar as páginas de um jornal. Damos as boas vinda à poderosa e de mente efervescente Edel.