AFP – Carolina Fung Feng faz parte dos mais de 600 mil “dreamers” (sonhadores) que aguardam com ansiedade a audiência que tem início na Suprema Corte dos Estados Unidos, a partir desta terça-feira (12), para analisar a decisão do presidente Donald Trump de encerrar um programa que protege os jovens migrantes da deportação.
Como outros “dreamers”, Carolina chegou aos Estados Unidos quando criança e está no limbo legal desde que Trump eliminou em 2017 o programa Ação Diferida para os Chegados na Infância (DACA), que permite que os jovens trabalhem, estudem e evitem a deportação para países de origem dos quais muitos nem mesmo se lembram.
Carolina, por exemplo, chegou aos Estados Unidos quando tinha 12 anos vinda da Costa Rica e agora depende da decisão dos nove juízes, sendo que cinco deles são conservadores e dois deles nomeados por Trump.
“A decisão deles não afeta apenas a mim como indivíduo, mas também minha família e minha comunidade”, afirma Carolina, que junto com dezenas de “sonhadores”, familiares e ativistas, percorreu durante 16 dias os 370 quilômetros entre Nova York e Washington para participar do processo.
Quando, em 2012, o governo de Barack Obama anunciou um programa para proteger mais de 600.000 jovens em situação ainda irregular e que chegaram ao país quando eram crianças, a maioria sentiu um grande alívio, transformado agora em uma grande incerteza.
O plano pretendia ser um arranjo temporário para dar tempo ao Congresso para legislar sobre o caso. Os representantes nunca chegaram a um acordo e, em 2017, Trump cancelou o programa.
Segundo dados do Serviço de Cidadania e Imigração (USCIS), existem 660.000 beneficiários registrados no DACA, dos quais 529.760 (pouco mais de 80%) chegaram do México. Também há jovens oriundos de El Salvador, Guatemala, Honduras, Peru, Coreia do Sul e Brasil, entre outros.
Vivendo nas sombras
Os tribunais que aceitaram os recursos a favor dos “sonhadores” indicaram que a suspensão do programa havia sido decidida “arbitrária e caprichosamente”. Em setembro passado, o representante do governo na Suprema Corte, Noel Francisco, argumentou que o procedimento para encerrar o DACA foi “legal e racional”.
Antonio Alarcón, de 25, é outro dos dois autores da ação. Ele veio do México para os Estados Unidos ainda criança. Quando foi protegido pelo DACA, sentiu que finalmente foi “reconhecido” pelos Estados Unidos, após passar anos “vivendo nas sombras”.
Se o Tribunal achar Trump certo, os “sonhadores” não serão automaticamente expulsos, mas ficarão “sem documentos”, com tudo o que isso implica.
Antonio disse estar confiante, pois seus pais o ensinaram a “ser um guerreiro”.
“Muitos dos nossos pais ainda não estão com a situação regularizada, e nossos parentes também não, mas eles sobrevivem de alguma forma”, explica.
Moeda de troca
No início deste ano, o DACA foi colocado no centro de um confronto entre o presidente republicano e os congressistas democratas. A queda de braço resultou em uma paralisia parcial do governo federal por mais de um mês, devido à falta de financiamento.
Trump se ofereceu para proteger temporariamente os “sonhadores”, em troca da aprovação de US$ 5,7 bilhões para construir o muro na fronteira com o México, sua principal proposta de campanha para conter a imigração irregular. A proposta foi rejeitada.
“Trump decidiu ir ao Supremo Tribunal para fazer o trabalho sujo de encerrar o programa, para que ele pudesse usar os beneficiários do DACA como moeda de troca”, afirmou Daniel Briones, um “sonhador” de 30 anos que mora no Texas. “Ele quer nos usar para construir o muro”, acrescenta.
O impasse também pode redefinir os limites da autoridade executiva, disse Steven Schwinn, professor de Direito da Universidade de Chicago.
“O caso levanta questões importantes sobre a capacidade do presidente de executar políticas por meio da não aplicação da lei”, explica o acadêmico.