
Milhares de jovens mexicanos, em sua maioria da Geração Z – nascidos entre 1997 e 2012 –, ocuparam as ruas da capital e de outras cidades no sábado (15) para exigir medidas mais duras contra as chamadas “narco-guerrilhas”, os cartéis de droga que controlam territórios inteiros no país. O protesto, batizado de “Marcha da Geração Z”, terminou em confrontos violentos com a polícia, deixando pelo menos 120 feridos – incluindo 60 agentes – e 20 detidos, segundo autoridades locais. Acusando o governo da presidente Claudia Sheinbaum de “cumplicidade” com o crime organizado, os manifestantes ergueu faixas com mensagens como “Somos todos Carlos Manzo”, em homenagem ao prefeito de Uruapan assassinado em 1º de novembro, e bandeiras piratas inspiradas no mangá japonês One Piece, símbolo global de rebelião juvenil contra opressores.
O estopim foi o homicídio de Carlos Manzo Rodríguez, de 40 anos, o primeiro prefeito independente de Uruapan (Michoacán), conhecido por sua cruzada contra extorsões e violência dos cartéis, como o Jalisco Nova Geração. Morto a tiros durante celebrações do Dia dos Mortos por um jovem de 17 anos ligado ao crime organizado, o caso simboliza a falência das políticas de segurança da esquerda mexicana, que priorizam abordagens sociais em detrimento de ações repressivas. “Não queremos mais abraços aos criminosos, queremos balas contra os narcos”, gritou uma manifestante de 22 anos à AFP, ecoando a frustração de uma juventude que vê o México registrar mais de 30 mil homicídios anuais, muitos ligados ao narcotráfico.
O movimento, organizado via redes sociais como Discord e Instagram pelo coletivo autodenominado “Geração Z México”, atraiu não só estudantes, mas também cidadãos comuns e opositores políticos. No Zócalo, praça central da Cidade do México, cerca de 17 mil pessoas marcharam pela Paseo de la Reforma, derrubando barreiras metálicas em frente ao Palácio Nacional e lançando pedras contra a tropa de choque, que rebateu com gás lacrimogêneo. Confrontos semelhantes ocorreram em Guadalajara e outras capitais estaduais, ampliando o alcance da revolta.
Apesar de Sheinbaum manter índices de aprovação acima de 60% em pesquisas recentes – graças a avanços em programas sociais e economia –, a segurança pública emerge como calcanhar de Aquiles: 72% dos mexicanos, segundo o El País, consideram a violência o principal problema nacional.
Uma insatisfação geracional transnacional
Esses protestos mexicanos traçam paralelos impressionantes com a onda de mobilizações lideradas pela Geração Z no Nepal, em setembro de 2025, que derrubou o governo em menos de 48 horas. Lá, o que começou como uma reação a uma proibição de 26 plataformas de redes sociais – vista como tentativa de silenciar a juventude – evoluiu para uma revolta massiva contra corrupção endêmica, nepotismo (“nepo kids”, filhos de elites exibindo luxos em meio à pobreza) e desemprego juvenil de 20,8%, conforme dados do Banco Mundial. Organizados via servidores Discord como “Youths Against Corruption”, que atingiram 150 mil membros, os nepaleses incendiaram prédios públicos, incluindo o Parlamento e a Suprema Corte, resultando em 74 mortes e centenas de feridos.
Assim como no México, os nepaleses usaram a bandeira pirata de One Piece como emblema de “libertação contra o governo autocrático”, e os protestos foram impulsionados por uma juventude digital nativa, farta de elites políticas que prometem transformação mas entregam desigualdade. Em ambos os casos, a criminalidade – no Nepal, a corrupção que drena recursos públicos e agrava a insegurança econômica; no México, as “narco-guerrilhas” que aterrorizam comunidades – serve de catalisador. “É a mesma raiva: governos que falham em proteger os jovens de um sistema predatório”, analisa o sociólogo indiano Alex Travelli, do The New York Times, que cobriu os eventos nepalenses. “No Nepal, o banimento das redes foi o fósforo; no México, o assassinato de Manzo. Mas o fogo é o mesmo: uma geração que não tolera mais promessas vazias.”
Essa convergência reflete uma insatisfação global da Geração Z, visível em levantes semelhantes na Indonésia e nas Filipinas, onde protestos contra retrocessos democráticos e corrupção também incorporaram símbolos pop como o Jolly Roger. No Nepal, o desfecho foi a renúncia do primeiro-ministro K.P. Sharma Oli e a nomeação de Sushila Karki como premiê interina, eleita via enquetes online nos protestos – um triunfo da democracia digital, mas com alertas sobre infiltrações externas e violência provocada.
O dilema da esquerda: segurança
A despeito dos altos índices de aprovação de Sheinbaum – herdeira de Andrés Manuel López Obrador, cujo mandato priorizou “abraços, não balas” contra o crime –, os protestos expõem as dificuldades históricas de governos de esquerda em combater a criminalidade com firmeza. Governos progressistas na América Latina, como os do Brasil sob Lula ou da Colômbia sob Petro, frequentemente enfrentam acusações de leniência, optando por reformas sociais em vez de militarização, o que agrava a percepção de impunidade.
No México, Michoacán exemplifica o impasse: um dos sete estados mais violentos, com décadas de desafio aos presidentes, independentemente de ideologia. Sheinbaum condenou a violência como “inorgânica” e “promovida do exterior”, sugerindo infiltração de direita e bots para inflar o movimento – repetindo táticas usadas por López Obrador. Sua viúva, no entanto, distanciou-se dos atos, e líderes como Bernardo Bravo, outro ativista anti-cartel assassinado em outubro, inspiram a base.
Analistas como os da Carnegie Endowment alertam que, sem ações concretas como fortalecimento da inteligência policial ou alianças internacionais contra o tráfico, a esquerda mexicana arrisca perder a juventude para narrativas populistas de direita.
Enquanto isso, a Geração Z mexicana conectada globalmente, avança. Com as eleições locais mexicanas em 2026, esses protestos sinalizam que a paciência da juventude com a insegurança acabou – e que a esquerda, para sobreviver, precisa equilibrar compaixão com contundência.


