Washington, 23 de dezembro de 2025 – O governo do presidente Donald Trump intensificou uma campanha nacional para anular milhares de pedidos de asilo em andamento nos tribunais de imigração, argumentando que os solicitantes podem ser deportados para países que não são os seus de origem, de acordo com dados internos do governo obtidos pela CBS News.
A iniciativa ganhou força nas últimas semanas, atingindo solicitantes de asilo com casos pendentes em tribunais de cidades como Atlanta, Nova York, Miami, Los Angeles, San Francisco, Texas e outras regiões dos EUA, conforme relataram advogados de imigração à CBS News.
Os tribunais de imigração são entidades administrativas geridas pelo Departamento de Justiça, e não pelo Poder Judiciário. Os juízes que julgam casos de deportação são supervisionados pelo departamento, enquanto advogados do Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas (ICE) representam o governo nos processos.
A nova tática consiste em advogados do ICE pedirem aos juízes que rejeitem os pedidos de asilo sem análise do mérito. Nessas moções, conhecidas como “pretermit”, o governo argumenta que solicitantes que temem perseguição em seus países de origem podem ser deportados para nações com as quais o governo Trump firmou acordos para receber deportados que não são seus cidadãos.
Documentos judiciais revisados pela CBS News e entrevistas com advogados revelam que o ICE solicitou a deportação para terceiros países como Guatemala, Honduras, Equador e Uganda. Se aprovadas, essas moções anulam os pedidos de asilo e abrem caminho para deportações, salvo recursos.
Dados internos inéditos indicam que, até o início de dezembro, advogados do ICE apresentaram mais de 8 mil moções para rejeitar pedidos de asilo com base nesses acordos.
A campanha é o mais recente esforço do presidente Trump para restringir drasticamente o acesso ao sistema de asilo americano, que sua administração alega ser abusado por migrantes em busca de oportunidades econômicas, especialmente aqueles que entraram ilegalmente pela fronteira sul durante o governo Biden.
Em declaração à CBS News, o Departamento de Segurança Interna (DHS) afirmou que o governo Trump está “trabalhando para remover imigrantes ilegais do país o mais rápido possível, garantindo todo o processo legal disponível, incluindo audiência perante um juiz de imigração”.
“O DHS utiliza todas as ferramentas legais para lidar com o acúmulo e o abuso do sistema de asilo”, acrescentou, citando “acordos bilaterais legais que permitem que imigrantes ilegais buscando asilo nos EUA busquem proteção em um país parceiro que concordou em julgar seus pedidos de forma justa”.
A estratégia baseia-se em uma seção da lei de imigração que desqualifica migrantes de asilo se eles puderem solicitar proteção em outro país com acordo de “terceiro país seguro” com os EUA.
No final de outubro, o Conselho de Apelações de Imigração (Board of Immigration Appeals), que revisa decisões dos tribunais de imigração, emitiu uma decisão que, segundo advogados, acelera o uso desses acordos para cancelar casos. A ordem determina que juízes decidam primeiro sobre moções do ICE para envio a terceiros países, antes de analisar os pedidos de asilo, transferindo o ônus da prova para os solicitantes demonstrarem risco de perseguição no terceiro país.
Embora o governo defenda que a medida combate fraudes no asilo, advogados de imigração afirmam à CBS News que ela afeta clientes com pedidos sólidos, fugidos de perseguição em países como Irã, Nicarágua e Rússia.
Os advogados argumentam que a campanha visa eliminar o caminho ao asilo nos EUA, coagindo solicitantes a desistirem ao ameaçá-los com deportação para países desconhecidos.
“Eles veem o sistema de asilo como um problema porque impede deportações rápidas”, disse Paúl Pirela, advogado de imigração em Houston. “Se você quer pedir asilo, estamos forçando você a fazê-lo em um país onde nunca esteve. Você simplesmente desiste e volta ao seu país ou vai para outro lugar.”
Pirela relatou que um cliente nicaraguense, dissidente político, foi ordenado deportado para Honduras após moção do governo. Outro cliente guatemalteco enfrenta tentativa similar de deportação para Honduras.
Em Atlanta, a advogada Adriana Heffley recebeu notificação quatro dias antes de uma audiência de que o DHS pediu para rejeitar o caso de seu cliente e deportá-lo para Uganda. O cliente, iraniano detido desde dezembro passado ao entrar ilegalmente, preparava argumento de perseguição por relações homoafetivas no Irã. Teve que provar risco também em Uganda. O juiz negou a moção.
“Imigrantes prestes a ter audiências que determinam o resto de suas vidas estão sendo surpreendidos com essa moção de última hora”, disse Heffley.
Em Nova York, o advogado David Treyster não está otimista com o caso de uma cliente russa e sua filha de 4 anos, que o DHS quer deportar para Uganda. O juiz inicialmente deu 30 minutos para consulta, mas Treyster conseguiu adiar. “O juiz pareceu indicar que suas mãos estão atadas” pela decisão do Conselho de Apelações. “Nem tivemos audiência, mas ela já dizia: ‘você terá que recorrer’.”
“A pessoa pediu asilo de forma correta, espera sua vez, cumpre tudo o que o governo quer – comparece às audiências, entrega documentos no prazo – e agora tiram esse devido processo”, acrescentou Treyster.
Alguns advogados contestam a tática judicialmente, incluindo a regulamentação de 2019 citada pelo ICE.
“Acho que isso alinha-se à tentativa da administração de eviscerar completamente a disponibilidade de asilo e outras proteções neste país”, disse Blaine Bookey, diretora jurídica do Center for Gender and Refugee Studies, em San Francisco, um dos grupos litigando o caso. “Para eles, é uma forma fácil de cortar o caso pela raiz.”


