JSNEWS – Na linha de frente da crise de imigração nos Estados Unidos, uma nova e inquietante realidade emerge em Los Angeles, a capital nacional dos sem-teto. Desde maio, agentes do Serviço de Imigração e Alfândega (ICE) têm sido avistados com frequência do lado de fora de um abrigo para jovens sem-teto em Hollywood, um espaço que acolhe pessoas de 18 a 24 anos, muitas delas fugidas de conflitos em seus países de origem. Aqui, a política de deportação em massa da administração Trump ganha um contorno ainda mais sombrio, com alvos que incluem os mais vulneráveis entre os vulneráveis.
Uma funcionária do abrigo que pediu para não ter seu sobrenome revelado por medo de represálias do ICE, testemunhou a prisão de dois jovens venezuelanos, de 20 e 22 anos, que haviam acabado de retornar do trabalho. “Não houve conversa”, disse ela, com a voz carregada de indignação. “Meia dúzia de agentes os abordou e algemou suas mãos atrás das costas imediatamente.” O jovem de 22 anos foi deportado, enquanto o paradeiro do outro permanece desconhecido. Este não é um caso isolado. Abrigos para sem-teto, antes considerados refúgios seguros, agora estão na mira de uma operação de imigração que já resultou em quase 3.000 prisões na região de Los Angeles.
Locais como Home Depots, lojas 7-Eleven e fazendas de cannabis já haviam sido alvos, mas a inclusão de abrigos para sem-teto marca uma nova e alarmante escalada. Relatos de enforcement em abrigos em North Hollywood e San Diego reforçam a percepção de que a administração Trump está expandindo seu alcance para comunidades já marginalizadas. Com mais de 72.300 pessoas sem-teto, Los Angeles é o epicentro da crise habitacional dos EUA. Quantos desses indivíduos são imigrantes? Não sabemos.
O censo anual obrigatório não inclui perguntas sobre cidadania, deixando um vazio de dados que obscurece ainda mais a situação. O que está claro, no entanto, é o impacto devastador da presença do ICE. “Isso coloca um alvo nas costas dos imigrantes sem-teto”, diz Donald Whitehead Jr., diretor executivo da Coalizão Nacional para os Sem-Teto. “Isso os vilaniza.”
No abrigo The People Concern, no centro de Los Angeles, o medo é palpável. John Maceri, CEO da organização, relata que menos clientes estão utilizando serviços como chuveiros e instalações públicas, temendo a chegada de agentes do ICE. Mesmo cidadãos americanos em moradias permanentes no Vale de San Fernando hesitam em sair de casa. “Francamente, qualquer pessoa de pele escura, negros e latinos, mas especialmente latinos de pele escura, não quer sair”, diz Maceri. “Eles evitam ir ao mercado. Alguns estão faltando ao trabalho. O fator medo está realmente tomando conta.”
Os números são reveladores. Segundo a Coalizão para os Direitos Humanos dos Imigrantes (CHIRLA), 471 das 2.800 prisões realizadas pelo Departamento de Segurança Interna entre 6 de junho e 20 de julho ocorreram em bairros predominantemente latinos do Vale de San Fernando. A presidente da CHIRLA, Angelica Salas, aponta para um padrão de “perfilamento racial”, uma acusação que o Departamento de Segurança Interna nega veementemente, afirmando que o foco está em pessoas em situação irregular, “não na cor da pele, raça ou etnia.”
Enquanto isso, a tensão só aumenta. Na última quinta-feira, o presidente Trump assinou uma ordem executiva que incentiva cidades a removerem pessoas sem-teto das ruas, uma medida que, segundo Whitehead, pode desencadear ainda mais prisões e intensificar o clima de medo.
Em Hollywood, os funcionários do abrigo agora acompanham os residentes em carros sem identificação para trabalhar, fazer compras ou comparecer ao tribunal, numa tentativa de protegê-los.
O abrigo, que pediu anonimato por medo de represálias, vive em estado de alerta. Entre os casos mais recentes, um solicitante de asilo da República Democrática do Congo, que usava um monitor de tornozelo imposto pelas autoridades de imigração, foi detido após comparecer ao tribunal de imigração para pedir a remoção do dispositivo. Ele foi levado ao Centro de Detenção de High Desert, em Adelanto, Califórnia, enquanto seu caso de asilo segue pendente.
Lailanie relata que ele teme ser deportado para a África Central, onde seu pai foi assassinado.O senador Alex Padilla, ele próprio algemado por agentes federais no último mês durante uma coletiva de imprensa, critica a estratégia da administração. “Eles prometeram focar em criminosos violentos, mas estão perseguindo pessoas em locais de trabalho, escolas, igrejas e agora acampamentos de sem-teto”, diz ele. “Isso não é sobre segurança pública. É sobre atingir comunidades vulneráveis.”
Enquanto a poeira da repressão imigratória se acumula, uma verdade permanece: em Los Angeles, o medo está corroendo a dignidade dos mais desamparados. “As pessoas estão com medo e sofrendo”, diz Lailanie. “Mas também estão determinadas a continuar lutando pelo que é certo.” Em meio à incerteza, a resiliência dos que servem e dos que são servidos permanece como um fio de esperança numa cidade sitiada por políticas desumanas.