Estadão Conteúdo – O chanceler mexicano, Marcelo Ebrard, sugeriu que o Brasil também pague a conta do cerco aos imigrantes ilegais exigido pelo presidente dos EUA, Donald Trump. Segundo ele, novas medidas seriam necessárias se o acordo com os americanos, anunciado na semana passada, não reduzir o número de imigrantes que entram no México a caminho dos EUA no prazo de 45 dias. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o Itamaraty disse ontem que não foi contatado por nenhum governo sobre o assunto.
Ebrard afirmou que “ações adicionais para restringir a imigração ilegal” devem envolver também Brasil, Panamá e Guatemala. “Precisamos da solidariedade deles”, disse o chanceler mexicano. “Do Brasil, porque é onde as pessoas de fora do continente chegam. Do Panamá, porque é onde chegam cubanos e haitianos. Da Guatemala, porque é por onde passam hondurenhos e salvadorenhos.”
Segundo o governo americano, no ano fiscal de 2019, que começou em outubro, foram apreendidas na fronteira do México com os EUA 27 mil pessoas de 37 países – exceto México. De acordo com o jornal USA Today, apenas no posto fronteiriço de Del Rio, no Texas, o número de detenções de não mexicanos aumentou 500% em relação ao ano passado.
Na semana passada, diz o jornal, um grupo de 37 congoleses foi preso ao tentar entrar nos EUA pela passagem de Del Rio. Apesar do aumento, o número de africanos ainda é irrisório diante do total de centro-americanos que fazem a travessia.
Estatísticas do governo americano mostram que apenas 367 imigrantes africanos foram presos na fronteira em 2018, um aumento de 44,5% em relação a 2017. No mesmo período, mais de 380 mil centro-americanos – incluindo 155 mil mexicanos – foram apreendidos ao tentarem entrar nos EUA.
O número relativamente baixo de africanos apreendidos se explica, segundo o USA Today, pelo fato de a maioria dos imigrantes da África preferir aguardar a conclusão do processo de asilo no México – o fato de não terem família ou conhecidos do lado americano faz com que eles não arrisquem a travessia.
O Brasil tem um papel duplo no fluxo regional de imigração. “O Brasil tem um papel curioso em nível mundial, mesmo sem conter os maiores índices de imigração. Pode ser tanto um país intermediário quanto um destino final”, afirma o coordenador do Projeto de Promoção dos Direitos dos Migrantes da USP, Victor Del Vecchio.
Enquanto alguns imigrantes de países africanos e asiáticos constroem uma rota incluindo o Brasil como parada estratégica, por uma “questão de fiscalização”, segundo Del Vecchio, a maioria daqueles que procuram viajar para os EUA, partindo do território brasileiro, tinha planos de se estabelecer aqui, mas mudou de ideia.
“Eles ficam decepcionados com o custo de vida e com os salários que não compensam”, explica o padre Paolo Parise, coordenador da entidade Missão Paz. As rotas que saem do Brasil em direção aos EUA são diversas e variam de acordo com o dinheiro disponível.
“O caminho mais barato é por terra, via Acre. Um imigrante me disse que pagou US$ 6 mil”, afirma Parise.
Del Vecchio explica a variação entre rotas aéreas e terrestres. “Uma rota frequente tem o Equador como ponto de parada, que tem uma política de vistos mais fácil do que de outros países. É um voo menos fiscalizado”, conta.
O presidente da ONG África do Coração, Jean Katumba Mulondayi, relata que cinco grupos, cada um com uma rota diferente, chegaram a sair ao mesmo tempo do Brasil. Ele acompanhou uma viagem ao Equador, seguindo para Costa Rica, México e EUA. “Eles saem sem saber o que vai acontecer. O destino fica nas mãos de Deus”, afirma.
O acordo entre EUA e México, anunciado na sexta-feira, evitou a imposição de tarifas gradativas sobre as importações de todos os bens mexicanos. Mesmo com todas as concessões, o governo americano foi criticado no fim de semana por ter capitulado nas negociações.
Por isso, desde segunda-feira, Trump garante que levará as tarifas adiante se o Congresso mexicano não aprovar uma parte ainda não revelada do acordo que os EUA pleiteam há muito tempo. Ontem, o presidente americano garantiu que o acordo tinha trechos “secretos” e exibiu uma folha de papel, sem mostrar detalhes. O governo mexicano nega que haja partes não divulgadas do acordo com Trump. (Com agências internacionais)
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.