
Em uma era de suposta inclusão, onde a diversidade cultural é exaltada como pilar da sociedade americana, surge uma observação incômoda: uma saudação como “Feliz Hosha Oshana” – o alegre grito de Domingo de Ramos na tradição copta – ou “Bom Ramadã” não provoca sem controvérsias em espaços públicos, mas “Feliz Natal” (Merry Christmas) é frequentemente tratado como uma provocação intolerável. Essa aparente assimetria, que transforma um desejo de paz em potencial ofensa, ganhou novo fôlego com o recente escândalo na cerimônia de iluminação da “árvore” de Portland, reportado pelo New York Post.
O evento, que ocorreu no último sábado (30 de novembro), ilustra não apenas o apagamento seletivo de símbolos cristãos, mas um duplo padrão que erode a herança ocidental enquanto protege certas minorias culturais. Como o historiador Tom Holland argumenta em Dominion (2019), o cristianismo moldou os valores de compaixão e direitos humanos do Ocidente; diluí-lo em nome da “equidade” pode corroer o solo de onde brotam esses ideais.
O Incidente de Portland: Uma “Árvore” Sem Nome, Uma Tradição Sem Voz
A 41ª edição anual da cerimônia de iluminação no Pioneer Courthouse Square, que atraiu milhares de residentes sob um céu nublado de outono, deveria ser um momento de união festiva. Em vez disso, gerou uma onda de indignação nas redes sociais e na mídia conservadora. Autoridades da cidade, incluindo a comissária pública Chloe Eudaley, optaram por rebatizar a icônica árvore de Natal de 75 pés – adornada com 10 mil lâmpadas – simplesmente como “a árvore” (the tree), eliminando qualquer menção a “Christmas” em anúncios, discursos e no programa oficial. “É uma celebração de doações invernais”, justificou um porta-voz municipal, enfatizando a inclusão para não “excluir” não-cristãos. O New York Post destacou o absurdo: oradores, incluindo membros de uma tribo indígena local, referiram-se ao ritual como “a iluminação da árvore”, enquanto uma ativista muçulmana, vestida com uma bandeira palestina, subiu ao palco para entoar cânticos de “Free Palestine” e alertar sobre “genocídios em curso”, transformando o evento em um fórum político. “Por que tudo tem que ser tão divisivo?”, questionou um residente no X (antigo Twitter), refletido o sentimento de comentaristas como Matt Walsh, que ironizou: “Eles nem conseguem dizer ‘árvore de Natal’ – é uma loucura”.
A ironia não passou despercebida: enquanto símbolos de outras tradições, como a bandeira palestina ou cânticos indígenas, foram acolhidos, o cerne cristão da celebração foi esterilizado. Essa renomeação não é um capricho isolado. Portland, conhecida por seu ativismo progressista, reflete uma tendência nacional: de escolas que substituem canções natalinas por hinos “neutros” a prefeituras que proíbem presépios em praças públicas. Como observou o filósofo Isaiah Berlin em seu ensaio sobre liberdades (1958), a “liberdade negativa” – a ausência de coerção – é sacrificada aqui em nome de uma “liberdade positiva” ilusória, onde a virtude sinalizada (virtue signaling) suplanta a autenticidade cultural.
O Duplo Padrão: Saudações Permitidas e Proibidas
A observação central – que desejar um “Bom Ramadã” ou “Feliz Kwanzaa” é visto como enriquecedor, mas “Feliz Natal” como ofensivo – revela uma assimetria profunda na cultura americana contemporânea. Durante o Ramadã, mês sagrado muçulmano de jejum e reflexão (que em 2025 ocorreu de 1º a 30 de março, mas frequentemente cai no inverno), empresas como Google e Starbucks promovem campanhas inclusivas com lanches pós-iftar e mensagens personalizadas, sem temores de “exclusão”.
Kwanzaa, feriado secular afro-americano criado em 1966 por Maulana Karenga para celebrar princípios como unidade (umojá) e criatividade (kuumba), de 26 de dezembro a 1º de janeiro, é exaltado em eventos comunitários e até na Casa Branca, com a vice-presidente Kamala Harris destacando-o como “essencial para a herança africana”.
Hanukkah, o Festival das Luzes judaico, brilha em vitrines públicas com menorás e girândolas (dreidels), e “Feliz Hanukkah” é uma saudação rotineira em escolas e escritórios. Contrastando, “Feliz Natal” – saudação que evoca o nascimento de Jesus, mas também tradições sincréticas como a árvore de origem germânica-pagã do século XVI – é frequentemente substituída por “Felizes Festas” (Happy Holidays) para evitar “microagressões”.
Pesquisas como a do Pew Research Center (2023) mostram que 68% dos americanos preferem “Merry Christmas”, mas o medo de litígios leva 49% das empresas a adotar neutralidade genérica. Essa seletividade não é acidental: reflete uma ortodoxia progressista que, como alerta Jordan Peterson em 12 Regras para a Vida (2018), impõe tolerância seletiva, onde minorias são blindadas, mas a maioria cultural (cristã, com 63% dos americanos se identificando como tal, per Gallup 2024) é silenciada.
Casos Reais: De Saudações a Demissões, o Preço da “Inclusão”
Essa tensão não é teórica; manifesta-se em repercussões concretas. Em 1987, no caso Kentucky Commission on Human Rights v. Lesco Manufacturing, uma secretária jeová testemunha foi demitida por recusar-se a atender o telefone com “Merry Christmas”, violando leis anti-discriminação religiosa sob o Title VII da Lei dos Direitos Civis de 1964. Inversamente, em 2008, Tonia Thomas, uma assistente em uma empresa de aluguéis na Flórida, alegou ter sido demitida por insistir em “Merry Christmas” em vez de “Happy Holidays”, mesmo oferecendo alternativas neutras. Representada pelo Liberty Counsel, ela processou por discriminação religiosa, argumentando que sua fé cristã a impedia de “secularizar o Natal”.
O empregador, que se descrevia como “cristão”, negou, chamando-a de “descontente”, mas o caso destacou o paradoxo: políticas de inclusão podem punir tanto quem evita quanto quem usa saudações religiosas.
Mais recentemente, em 2019, um suposto gerente de Starbucks em Charlotte, Carolina do Norte, viralizou ao ameaçar demitir funcionários por dizerem “Merry Christmas”, citando “desgosto por cristãos conservadores” – embora o incidente tenha sido desmentido como sátira, ele expôs medos reais. Como resume um relatório da ACLJ (American Center for Law and Justice, 2020), esses episódios invertem a lógica: empregadores evitam “Merry Christmas” para não ofender minorias, mas ignoram que tal proibição pode discriminar cristãos, criando um ambiente de “autovigilância orwelliana”.
Uma Pluralidade Genuína: Rumo a um Diálogo Autêntico
O caso de Portland, com sua “árvore” anônima e cânticos políticos, não é mero folclore festivo; é um sintoma de uma cultura que, sob o manto da inclusão, pratica uma iconoclastia moderna contra o cristianismo. Como T.S. Eliot ponderava em Notas para a Definição da Cultura (1948), “a tradição não pode ser herdada; deve ser apropriada pelo espírito vivo”.
Críticas como esta não buscam restaurar um teocentrismo opressivo, mas defender uma pluralidade autêntica: onde “Feliz Hosha Oshana” coexista com “Feliz Natal”, “Bom Ramadã” com “Feliz Kwanzaa”, sem hierarquias impostas.
Em uma América de 2025, onde o Natal – celebrado por 90% dos lares, per Religion News Service – ainda pulsa como coração cultural, urge um equilíbrio. Empresas e municípios poderiam, por exemplo, adotar roteiros que celebrem especificidades: “Que seu Ramadã traga misericórdia, seu Kwanzaa unidade, e seu Natal paz”. Assim, preservamos o “espírito vivo” de Eliot, honrando diferenças sem apagá-las. Enquanto Portland acende suas luzes genéricas, a pergunta persiste: inclusão verdadeira celebra heranças ou as dilui em um “inverno sem nome”? Para os que observam, como nosso leitor, o Natal de 2025 pode ser o momento de reacender o debate – com gentileza, mas firmeza. Feliz Natal a todos que o celebram; e que as festas, em sua diversidade, nos unam.


