JCEDITORES – Nos últimos anos, os Estados Unidos têm enfrentado um aumento alarmante de práticas conhecidas como “rebocamento predatório” ou predatory towing em inglês, um golpe que explora motoristas em momentos de vulnerabilidade, como após acidentes ou em estacionamentos privados. Esse esquema, que combina oportunismo com falta de transparência, tem crescido 89% nos últimos três anos, segundo o National Insurance Crime Bureau (NICB), e afeta tanto grandes centros urbanos quanto pequenas comunidades. Embora o problema esteja disseminado por diversos estados, como Califórnia, Illinois, Flórida, Mississippi, Tennessee, Geórgia, Carolina do Norte, Virgínia, Maryland, Nova Jersey e Nova York, Massachusetts merece destaque devido à sua combinação de regulamentações insuficientes e casos recorrentes, especialmente em cidades como Boston, Quincy e Waltham.
Um problema Nacional
O rebocamento predatório é uma prática em que empresas de reboque, muitas vezes sem licença ou operando à margem da lei, aproveitam-se de motoristas para lucrar com taxas exorbitantes. Segundo Chris Stroisch, vice-presidente de assuntos públicos do NICB, o custo médio de um reboque nos EUA é de US$ 109, mas em casos predatórios, as cobranças podem chegar a US$ 17.000, repletas de taxas vagas como “armazenamento” ou “liberação” conforme reportado pela rede Fox News, em março deste ano. De acordo com Fox News empresas frequentemente aparecem em cenas de acidentes sem serem chamadas, alegando falsamente terem sido enviadas pela polícia ou seguradoras, e pressionam as vítimas a assinar alguns documentos. Após rebocar o veículo, elas o retêm em pátios, exigindo pagamentos altos que, em muitos casos, não são cobertos por seguros. O problema é agravado pela falta de regulamentação.
Stroisch destaca que, enquanto alguns estados possuem leis que exigem licenciamento de empresas de reboque e transparência nas tarifas, outros, como Indiana, Iowa e Vermont, carecem de proteções robustas. No ano passado, estados como Flórida, Mississippi, Tennessee, Virgínia e Colorado aprovaram legislações para combater essas práticas, mas a implementação varia. Na Flórida, por exemplo, novas leis exigem que empresas publiquem tarifas e aceitem múltiplas formas de pagamento.
Massachusetts: Um Foco de Preocupação
Em Massachusetts, o rebocamento predatório é uma questão persistente, impulsionada por regulamentações parciais e pela densidade de veículos em áreas urbanas. Um relatório recente da da Massachusetts Public Interest Research Group (MASSPIRG) revelou que o estado oferece apenas 6 das 14 proteções recomendadas contra esse tipo de golpe, recebendo uma nota C- em proteção ao consumidor. Apesar de leis que estipulam taxas máximas, atualmente US$ 132 para reboques não consentidos e US$ 35 por dia de armazenamento, e exigem notificação à polícia após o reboque, lacunas significativas permanecem. Por exemplo, não há obrigatoriedade de aceitar cartões de crédito, o que dificulta a recuperação de veículos, e a sinalização em estacionamentos privados nem sempre é clara.
As cidades mais afetadas em Massachusetts incluem:
- Boston: A capital do estado é um epicentro devido ao tráfego intenso e à abundância de estacionamentos privados. Casos tidos como emblemáticos como o de Dorchester, em 2018, ilustram a prática: um veículo foi rebocado de um estacionamento quase vazio em menos de 10 minutos, com a empresa cobrando a taxa máxima permitida. A falta de transparência nas tarifas e a rapidez dos reboques dificultam a contestação pelos motoristas.
- Quincy: Relatos apontam para reboques abusivos em áreas comerciais, onde veículos são removidos sem aviso claro, muitas vezes sob a justificativa de “monitoramento” por “observadores” contratados.
- Waltham: Um caso notório envolveu uma ação judicial contra uma empresa de reboque acusada de operar uma rede de “olheiros” que lucrava ao identificar veículos para remoção, mesmo quando os motoristas eram clientes legítimos de estabelecimentos.
Como o Golpe é Executado
As táticas do rebocamento predatório são sofisticadas e exploram a vulnerabilidade das vítimas. Em Massachusetts, o modus operandi inclui:
- Monitoramento Agressivo: Empresas contratam “olheiros” para vigiar estacionamentos privados, como os de lojas e restaurantes. Esses indivíduos reportam veículos que supostamente violam regras, muitas vezes sem considerar fatores como tempo de permanência ou comprovantes de compra.
- Remoção Rápida: Veículos são rebocados em poucos minutos, antes que o motorista possa retornar. Em Boston, há relatos de carros removidos em menos de 10 minutos, mesmo em locais com baixa ocupação.
- Falta de Transparência: As empresas raramente fornecem recibos detalhados, e as taxas incluem itens vagos, como “serviços administrativos”. A ausência de placas sinalizando tarifas o que facilita a cobrança abusiva.
- Pressão Psicológica: Após o rebocamento do veiculo, os depósitos muitas vezes exigem pagamento em dinheiro, dificultando a liberação do veículo. Motoristas relatam tratamento hostil e ameaças de taxas diárias crescentes caso o pagamento não seja imediato.
Em situações de acidentes, a prática é ainda mais insidiosa. Empresas monitoram comunicações policiais ou chegam ao local sem solicitação, oferecendo “ajuda” que resulta na remoção do veículo para oficinas parceiras. Um caso na Califórnia, citado pelo NICB, envolveu uma quadrilha que lucrou US$ 216.932 com fraudes relacionadas a reboques e reparos falsos, uma tática que também ocorre em Massachusetts.
Falta clareza nas Operações
A falta de clareza é o cerne do rebocamento predatório. Em Massachusetts, motoristas frequentemente desconhecem seus direitos, como o de acessar itens pessoais no veículo sem custo ou contestar reboques ilegais. A MASSPIRG aponta que a ausência de uma “carta de direitos” unificada para motoristas agrava o problema.
Muitos pátios operam em horários limitados, dificultando a recuperação do carro, e a falta de exigência de pagamento por cartão cria barreiras adicionais.
Além disso, a relação entre empresas de reboque e proprietários de estacionamentos privados é pouco regulamentada. Há suspeitas de que alguns estabelecimentos recebem comissões por cada veículo rebocado, prática proibida em apenas 16 estados. Em Massachusetts, essa questão permanece nebulosa, com poucos casos investigados a fundo.
Impactos e Soluções
O rebocamento predatório não é apenas um inconveniente financeiro; ele pode devastar famílias, especialmente aquelas com recursos limitados. Em Massachusetts, motoristas relatam dificuldades para pagar taxas que consomem economias ou forçam dívidas. Um estudo da American Transportation Research Institute de 2023 destacou que caminhoneiros também são alvos, enfrentando atrasos e custos adicionais.
Para combater o problema, especialistas sugerem:
- Após um acidente, confirme com a seguradora ou a polícia se o reboque foi autorizado. Não assine documentos sem ler.
- Exija recibos detalhados e fotografe o local do reboque, se possível.
- Registre queixas de casos abusivos no Departamento de Serviços Públicos de Massachusetts ou na Procuradoria Geral.
- Reformas Legislativas: Projetos como o S. 2085 em tramitação no estado de Massachusetts, buscam ampliar proteções, como exigir pagamentos por cartão e acesso imediato a itens pessoais, atualmente não existe uma lei que proíba o acesso a itens pessoais que estão dentro de um veiculo, a lei proposta apenas deixa claro esse direito.
O rebocamento predatório é um golpe que prospera na vulnerabilidade e na falta de clareza, afetando motoristas em todos os EUA, de Los Angeles a Massachusetts, cidades como Boston, Quincy e Waltham destacam-se pela incidência, impulsionada por táticas agressivas e regulamentações insuficientes. Embora avanços legislativos estejam em curso, a proteção efetiva exige maior transparência, fiscalização rigorosa e conscientização pública.
Até que essas medidas protetivas se consolidem em âmbito nacional, os motoristas devem permanecer vigilantes, pois, como alerta Chris Stroisch, vice-presidente de assuntos públicos do NICB, “esses operadores estão atrás do lucro, e as vítimas são aquelas que menos podem pagar”.