Agencia Globo – O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) interrompeu, nesta segunda-feira, o julgamento de duas ações que pedem a cassação do senador Sergio Moro (União Brasil). Primeiro a votar, o relator do caso, o desembargador Luciano Carrasco Falavinha Souza, já se manifestou contra a perda do mandato do ex-juiz. Após pedido de vista apresentado na sequência, o caso voltará a ser apreciado na próxima quarta.
Em extensa exposição, o relator afirmou que, para sustentar a hipótese de extrapolação dos limites de gastos em uma candidatura à Presidência para beneficiar indevidamente Moro na corrida ao Senado, as argumentações da Federação Brasil da Esperança, em que está incluído o PT, e o PL deveriam apontar uma intenção deliberada de usar a exposição midiática para concorrer ao Senado pelo Paraná.
“Para que fosse possível concluir que o investigado Moro extrapolou limites de gastos porque usou da frustrada candidatura à Presidência para se cacifar para o Senado no Paraná, era imprescindível comprovar que ele, desde o início do projeto, tinha a intenção de se candidatar pelo Paraná. Na espécie, isso não ocorreu”, argumenta o desembargador.
Em sinal de defesa da posição do senador, Falavinha Souza ainda falou que há “ingenuidade” em não tratar o caso em questão como algo do campo da política, envolvendo “retaliação futura” e “alvo de desforra”:
“É muita ingenuidade acreditar que o investigado, atuando como juiz em grande investigação de combate à corrupção que afetou razoável parte do quadro político, ao sair de magistratura e ingressar no governo beneficiado eleitoralmente pela indicada operação, não seria atacado. Que saindo desse governo atirando não recebida retaliação futura e, ao fim e ao cabo, sair candidato e sagrando-se vencedor em candidatura ao Senado contra aquele que lhe abriu a candidatura presidencial, não poderia ser alvo de desforra”.
A sessão começou com explanação dos advogados dos partidos que moveram ações questionando a conduta de Moro durante a pré-campanha. O primeiro a discursar na tribuna foi o advogado do PL-PR, Bruno Cristaldi, foi o primeiro a falar e alegou que a disparidade da candidatura de Moro começa ainda no período pré-eleitoral, quando ele é lançado pelo partido como um futuro presidenciável. Segundo ele, isso já lhe permitiu uma exposição maior do que a dos demais concorrentes.
“O foco aqui é falar da superexposição, do abuso de poder econômico e dos gastos e indícios de corrupção, triangulação de recursos e caixa 2. Uma campanha a presidente da República veio acompanhada de todo o acervo que a grande mídia coloca à disposição de um presidenciável, como o acompanhamento do dia a dia das ações”, explicou o advogado, que questionou também a contratação de empresa de suplentes do senador para a execução de serviços de campanha.
O advogado de defesa do PT, Luiz Eduardo Peccinin, também apresentou argumentações durante o julgamento. Ele pontuou a existência de limites, tanto de prazo para o início de campanhas, assim como para gastos, durante o período eleitoral.
“Usou fundo partidário para quê? Para tirar férias? Para fazer turnê? É dinheiro público, é fundo partidário. Pouco importa a intenção, a análise é objetiva. Se fez uma gastança de dinheiro para se comprometer a igualdade de oportunidades”, alegou.
O terceiro a falar na sessão foi advogado defesa de Sérgio Moro, Gustavo Guedes. Ele citou falas do deputado federal Zeca Dirceu (PT) e do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, para negar que os gastos de pré-campanha de Moro tenham influenciado a sua eleição.
“Não há lei que regule pré-campanha no Brasil. Ninguém pode declarar, se quiser. Nem o Moro podia, nem o André Janones, nem o governador Eduardo Leite, que ia ser candidato a presidente e desistiu. Nem o governador Ronaldo Caiado, que está fazendo pré-campanha agora. Não há lei, não há precedentes e há pouca doutrina. .(…) Nada há de ilegal. O senador Sergio Moro não se elegeu por conta de uma pré-campanha, ele se elegeu porque o cidadão paranaense quis, por conta de seu trabalho anticorrupção”, pontuou Gustavo Guedes
Outra estratégia da defesa de Moro foi refutar qualquer semelhança do caso de Moro com o da ex-senadora Selma Arruda, cassada em 2019 por abuso de poder econômico.
“O que foi imputado no caso da senadora foi antecipação de gastos típicos de campanha no período de pré-campanha, que ela teria feito uma contratação prévia e pago previamente para usar o material na campanha. Lá havia um HD com peças publicitárias, jingles, material e adesivos. Aqui não há absolutamente nada disso”, argumentou.
Parecer do MPE
O procurador do Ministério Público Eleitoral Marcelo Godoy defendeu seu parecer favorável à cassação do senador Sergio Moro. “O parecer faz a relação dos gastos, que extrapolam até mesmo os 30% de gasto de uma pré-campanha, e faz relação disso com a quebra de isonomia com os demais pré-candidatos, considerando que uma campanha de nível nacional leva a ações que direta ou indiretamente trarão visibilidade”.
Entenda as acusações
O ex-juiz da Lava-Jato responde a duas ações de investigação judicial eleitoral (AIJEs) apresentadas pelo Partido Liberal e pela Federação Brasil da Esperança, composta pelo PT, PV e PCdoB. Caso Moro seja cassado, além de perder o mandato, ele pode ficar inelegível por oito anos.
Os processos questionam gastos com sua pré-campanha, período em que o então candidato desistiu de concorrer à Presidência para disputar o Senado. Com base em notas fiscais enviadas pelo União e por sua antiga legenda, o Podemos, o Ministério Público Eleitoral (MPE) calculou gasto de R$ 2,03 milhões e considerou que o valor foi excessivo para a disputa ao Senado no Paraná, o que configura, na avaliação do órgão, abuso de poder econômico. Diante dos gastos excessivos, o Ministério Público Federal solicita a condenação do parlamentar por abuso de poder econômico.
Para fundamentar o pedido, o caso da senadora Selma Arruda, condenada após as eleições de 2018, é citado no documento. Na ocasião, a parlamentar perdeu o mandato “em razão do investimento de valores copiosos em pré-campanha”. A parlamentar era conhecida como “Moro de saias”. De acordo com colunista do GLOBO Malu Gaspar, aos advogados de Moro vão concentrar a defesa na tentativa de dissociar o caso ao da ex-senadora.
Trocas no tribunal
O julgamento já foi adiado algumas vezes. A mais recente foi com o afastamento do advogado Thiago Paiva dos Santos, que era membro do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) desde 2019. Ele se despediu da Corte em janeiro, após o fim do mandato. O advogado foi substituído pelo jurista José Rodrigo Sade, indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a partir de uma lista tríplice elaborada pelo tribunal.
Além de Sade, o julgamento deve ter as participações dos desembargadores Sigurd Roberto Bengtsson, presidente da Corte; Luciano Carrasco Falavinha Souza, relator dos processos de Moro; Claudia Cristina Cristofani, juíza federal efetiva; e os doutores Anderson Ricardo Fogaça, juiz de direito efetivo; Guilherme Frederico Hernandes Denz, juiz de direito efetivo e Julio Jacob Junior, classe de advogado efetivo. Sete membros compõem o tribunal.
Para que o senador seja cassado, a maioria precisa julgá-lo culpado. Em caso de empate, o presidente da Corte é responsável pelo voto de desempate.
Em dezembro de 2023, Moro falou, em depoimento ao TRE-PR, que não obteve vantagem eleitoral, negando a acusação de desequilíbrio eleitoral causado por pré-campanha irregular ao cargo de presidente da República.