WASHINGTON — O Senado dos Estados Unidos avançou, na noite de domingo, um acordo bipartidário destinado a pôr fim ao shutdown governamental mais prolongado da história do país, com 40 dias de paralisação que afetaram trabalhadores federais, segurança aérea e programas de assistência. A medida, aprovada por 60 votos a 40 em votação preliminar, combina três projetos de lei de apropriações anuais completas — abrangendo departamentos como o da Agricultura até o fim do ano fiscal de 2026 — e uma resolução continuada que mantém o financiamento dos demais órgãos nos níveis atuais até 30 de janeiro. O pacote inclui ainda o financiamento integral do Programa Suplementar de Assistência Nutricional (SNAP) até setembro de 2026 e reverte as notificações de redução de força (RIFs) emitidas pela administração Trump para dispensas de funcionários federais durante o shutdown.
Negociado por um grupo de democratas em conjunto com republicanos, incluindo as senadoras Jeanne Shaheen e Maggie Hassan, ambas de New Hampshire, e o independente Angus King, do Maine, o acordo recebeu endosso do líder da maioria no Senado, John Thune (R-Dakota do Sul), e da Casa Branca. Oito democratas uniram-se a republicanos para superar o obstáculo inicial: Shaheen, Hassan, King, Catherine Cortez Masto (D-Nevada), Dick Durbin (D-Illinois), John Fetterman (D-Pensilvânia), Tim Kaine (D-Virginia) e Jacky Rosen (D-Nevada).
Se aprovado definitivamente no Senado, o texto seguirá para a Câmara dos Representantes — atualmente em recesso desde setembro — e necessitará da assinatura do presidente Donald Trump para reabrir o governo, processo que pode demorar dias.Em concessão significativa, os democratas abdicaram da extensão imediata dos subsídios expirantes do Affordable Care Act (ACA), cuja lapsação elevaria prêmios de seguro para milhões de americanos. Em troca, obtiveram compromisso de votação no Senado sobre projeto de prorrogação até a segunda semana de dezembro, embora o resultado permaneça incerto e o presidente da Câmara, Mike Johnson (R-Louisiana), tenha recusado garantir análise na Casa.
“Este acordo garante votação para estender os créditos fiscais de prêmios do ACA, algo que os republicanos não estavam dispostos a fazer”, afirmou Kaine, ex-governador da Virginia reeleito para terceiro mandato em 2024, destacando também a proteção à força de trabalho federal, com reintegração de demitidos indevidamente e pagamento retroativo. Thune, no plenário, expressou otimismo: “Após 40 longos dias, espero que possamos finalmente encerrar este shutdown”, citando a “situação verdadeiramente precária” de controladores de tráfego aéreo e agentes da TSA sem salários, além de atrasos em aeroportos. King, reeleito para terceiro termo e crítico inicial da estratégia de shutdown, justificou a mudança democrata: “À medida que o shutdown avança, uma solução para o ACA torna-se mais provável? Aparentemente não. Muitas pessoas estão sendo prejudicadas no intervalo”.
Outros negociadores reforçaram a urgência. Durbin, veterano da liderança democrata que se aposenta ao fim do mandato, enfatizou os custos: “Por 40 dias — o shutdown mais longo da história dos EUA —, trabalhadores federais ficaram sem salários, incluindo controladores de tráfego aéreo já subdimensionados, trabalhando 10 horas diárias, seis dias por semana”. Shaheen, autora de projeto para extensão permanente dos créditos do ACA e que não buscará reeleição em 2026, declarou: “Esperar mais só prolongará a dor dos americanos. Semanas de negociações com republicanos deixaram claro que não abordarão saúde como parte das talks do shutdown”.
Hassan, ex-governadora reeleita em 2022, mencionou relatos de constituintes afetados por aumentos iminentes em custos de saúde e pela paralisação. Cortez Masto e Rosen, ambas de Nevada, apontaram filas em bancos de alimentos comparáveis à pandemia de Covid-19 e impactos no turismo por interrupções no tráfego aéreo. Fetterman, eleito em 2022, alertou que o Partido Democrata “pode estar exagerando” e que “nada foi accomplido nos últimos 40 dias além de caos”.
A reação entre democratas foi mista e marcada por divisões. O líder da minoria, Chuck Schumer (D-Nova York), votou contra: “Por causa dos republicanos, os americanos sofrerão imensamente à medida que esta crise de saúde piora”. Chris Murphy (D-Connecticut) chamou de “erro”, argumentando que o projeto não detém a “catástrofe de saúde” nem limita “ilegalidades” de Trump, e lamentou ignorar o recado das urnas.
Ruben Gallego (D-Arizona), cotado para disputa presidencial em 2028, opôs-se firmemente: “Não virarei as costas para os 24 milhões de americanos que verão prêmios mais que dobrar”. Bernie Sanders (I-Vermont) criticou nas redes: “Votarei não na resolução que dobrará prêmios para 20 milhões, expulsará 15 milhões do Medicaid e permitirá 50 mil mortes desnecessárias anualmente, tudo para dar US$ 1 trilhão em cortes fiscais a bilionários”. Fora do Senado, o backlash foi imediato. O deputado Ro Khanna (D-Califórnia) escreveu no X: “O senador Schumer não é mais efetivo e deve ser substituído. Se não lidera a luta para impedir que prêmios disparem, para que lutará?”. A deputada Mikie Sherrill (D-Nova Jersey), eleita governadora na semana passada, condenou: “Se este acordo passar, levará nova-jerseyanos a pagar muito mais por saúde”.
O acordo segue negociações bicamerais intensas, com conservadores impondo a resolução curta até 2026, superando apelos da presidente do Comitê de Apropriações do Senado, Susan Collins (R-Maine), por prazo em meados de dezembro. Republicanos haviam rejeitado proposta democrata anterior de reabertura com extensão de um ano dos fundos do ACA. Shaheen, questionada sobre votar contra financiamento em janeiro caso a extensão do ACA falhe, respondeu: “Certamente uma opção que todos considerarão”.
O texto agora enfrenta incertezas na Câmara, onde apoio democrata não é garantido.


