
– Nessa segunda-feira, 7, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, causou polêmica ao publicar uma mensagem em sua rede social, Truth Social, defendendo o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que enfrenta um processo judicial no Supremo Tribunal Federal (STF) acusado de liderar uma tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. A declaração de Trump, que classificou as ações contra Bolsonaro como uma “caça às bruxas”, gerou reações imediatas no Brasil, incluindo uma resposta firme do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, enquanto o STF optou pelo silêncio.
O que Trump disse: Em sua postagem, Trump afirmou que Bolsonaro é vítima de “perseguição política” e que o Brasil está agindo de maneira “terrível” ao tratar o ex-presidente. Ele escreveu: “Brasil está cometendo um erro terrível ao perseguir Jair Bolsonaro, sua família e milhares de seus apoiadores. Ele não é culpado de nada, exceto ter lutado pelo povo. Estarei observando essa caça às bruxas de perto. O único julgamento que deveria ocorrer é o dos eleitores brasileiros, em uma eleição.” Trump comparou a situação de Bolsonaro à sua própria experiência, alegando que também foi alvo de perseguições judiciais nos EUA, e pediu que o Brasil “deixe Bolsonaro em paz”.
A manifestação de Trump veio no contexto da cúpula do BRICS, realizada no Rio de Janeiro nos dias 6 e 7 de julho, onde ele já havia criticado o bloco por promover “políticas antiamericanas” e ameaçado impor tarifas adicionais a países alinhados ao grupo.
Sem citar diretamente Trump ou Bolsonaro, o presidente Lula respondeu no X, reafirmando a soberania brasileira: “A defesa da democracia no Brasil é um tema que compete aos brasileiros. Somos um país soberano. Não aceitamos interferência ou tutela de quem quer que seja. Possuímos instituições sólidas e independentes. Ninguém está acima da lei, sobretudo os que atentam contra a liberdade e o estado de direito.”
A ministra Gleisi Hoffmann, presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), foi mais direta, declarando: “Trump deveria cuidar de seus próprios problemas — que não são poucos — e respeitar a soberania do Brasil e nosso sistema judicial.” Outros membros do governo Lula, como o ministro das Relações Exteriores Mauro Vieira, também reforçaram a autonomia das instituições brasileiras, enquanto aliados de Bolsonaro, como o senador Flávio Bolsonaro e o governador Tarcísio de Freitas, elogiaram o apoio de Trump e defenderam que o ex-presidente deveria ser julgado “pelas urnas” e não pela Justiça.
Já o Supremo Tribunal Federal, que conduz o processo contra Bolsonaro, não emitiu nenhuma declaração oficial em resposta à postagem de Trump. A Corte, presidida pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, mantém o foco na investigação, que acusa Bolsonaro e sete aliados de planejar um golpe para impedir a posse de Lula em janeiro de 2023, culminando nos ataques de 8 de janeiro em Brasília. O silêncio do STF reflete sua postura de evitar confrontos diretos com atores internacionais, priorizando a independência judicial e a continuidade do processo, que está na fase final de instrução, com sentença esperada nos próximos meses.
Bolsonaro é réu no STF por liderar uma suposta organização criminosa que planejou reverter os resultados das eleições de 2022, nas quais foi derrotado por Lula. A investigação, conduzida pela Polícia Federal ao longo de dois anos, aponta que o ex-presidente, com apoio de militares e aliados, incentivou atos que culminaram na invasão das sedes dos Três Poderes em Brasília. Além disso, Bolsonaro está inelegível até 2030, por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), devido a abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação durante a campanha de 2022.
Por que Trump Disse Isso?
A declaração de Trump defendendo Bolsonaro e criticando o Brasil pode ser explicada por uma combinação de fatores políticos, ideológicos e estratégicos, especialmente no contexto das posições externas do Brasil, que têm gerado interpretações de um alinhamento antiocidental.
- Afinidade Ideológica e Pessoal: Trump e Bolsonaro compartilham uma visão populista de direita, com críticas às instituições tradicionais e narrativas de vitimização política. Ambos se descrevem como alvos de “perseguições” judiciais, o que cria um paralelo entre suas experiências. Trump, que já enfrentou processos nos EUA, vê em Bolsonaro um aliado que reflete sua própria luta contra o que chama de “establishment”. Ele escreveu: “Isso aconteceu comigo, vezes 10,” sugerindo uma identificação pessoal com o caso.
- Oposição ao Governo Lula e ao BRICS: A declaração de Trump ocorre em meio à cúpula do BRICS, que ele acusou de promover “políticas antiamericanas”. O Brasil, sob Lula, tem fortalecido o bloco, que inclui China, Rússia, Índia, África do Sul e novos membros como o Irã, como um contrapeso à influência ocidental.
A retórica de Lula na cúpula, comparando o BRICS ao Movimento dos Não Alinhados da Guerra Fria, e sua crítica ao “protecionismo” ocidental reforçam a percepção de que o Brasil busca uma ordem globalista, um governo único, não centrada nos EUA, mas uma nova ordem mundial. - Posicionamento Antiocidental do Brasil? As posições recentes do Brasil no cenário internacional têm gerado controvérsia e interpretações de um viés antiocidental. Durante a cúpula do BRICS, o Brasil apoiou uma declaração que condena os ataques de Israel e dos EUA contra instalações nucleares iranianas e a crise humanitária em Gaza, enquanto evita críticas diretas à Rússia pela invasão da Ucrânia e tem manifestado apoio ao Hamas.
Lula classificou Israel como estado genocida provocando críticas de grupos pró-Israel no Brasil e no exterior.
Embora o Brasil oficialmente tenha condenado os ataques do Hamas, a fala do presidente revela outro posicionamento bem como manifestadas pelo Partido do Trabalhadores, além disso, a aproximação com o Irã via BRICS, é vista por alguns como um distanciamento dos interesses ocidentais, especialmente dos EUA e de Israel. Essas posições, somadas à retórica de Lula contra o “imperialismo” ocidental, apoio as ditaduras da america latina que notoriamente desrespeitam o processo eleitoral e os direitos humanos, podem ter motivado Trump a perceber o Brasil de Lula como um desafio à influência americana e fonte de apoio a inimigos notórios. - Estratégia Política Doméstica e Global: Trump pode estar capitalizando a defesa de Bolsonaro para mobilizar sua base nos EUA, que valoriza líderes conservadores como o ex-presidente brasileiro, e projetar influência global. Ao se posicionar como defensor de Bolsonaro, ele reforça sua narrativa de combate ao “globalismo” e a sistemas judiciais que julga politizados. Além disso, a declaração pode ser uma tentativa de manter relevância no cenário internacional, especialmente em um momento em que Lula enfrenta queda de popularidade interna, desafios econômicos, corrupção desenfreada como o escândalo dos aposentados.
- Crítica Ideológica às Democracias Ocidentais: Lula tem criticado o que considera “imperialismo” das democracias ocidentais, defendendo maior autonomia para o Sul Global. Em discursos, ele questionou a concentração de renda e poder nas mãos de nações ricas, apontando que “a democracia começa a falhar quando não atende aos interesses do povo”. Essa visão, aliada ao fortalecimento do BRICS e seu posicionamento ao lado da Rússia em relação ao conflito da Ucrânia, alimenta a percepção de que o Brasil, sob Lula, adota um posicionamento ideológico que desafia os valores ocidentais tradicionais. Para Trump, que vê o mundo em termos de aliados e adversários, isso pode justificar sua fala em apoio a Bolsonaro, um líder alinhado aos valores ocidentais das democracias liberais.
- Confusão nas Posições Brasileiras: A política externa brasileira tem sido vista como confusa por alguns analistas, pois combina gestos de neutralidade com críticas seletivas. Por exemplo, o Brasil mantém laços econômicos com os EUA e a UE, mas evita alinhamento automático com os valores que representam Ocidente, priorizando o BRICS e a cooperação Sul-Sul. Essa ambiguidade, somada às críticas de Lula ao “imperialismo das democracias liberais” e à sua retórica pró Hamas, pode ser interpretada como antiocidental, especialmente por figuras como Trump, que enxergam, assim como Lula, o mundo em termos binários.
Enfim, a declaração de Trump reflete uma combinação de afinidade pessoal com Bolsonaro, oposição ao governo Lula e ao BRICS, e uma tentativa de capitalizar politicamente a narrativa de perseguição. A resposta de Lula reforça a soberania brasileira e a independência de suas instituições, enquanto o silêncio do STF demonstra cautela em um momento de alta sensibilidade política.
As posições externas do Brasil sob Lula, marcadas por críticas as democracias liberais do ocidente e aproximação com o regime da China, Rússia e Irã, alimentam a percepção de que uma escolha foi feita.