
Boston, 22 de Julho de 2025 – Quando Donald Trump anunciou o Golden Dome, seu escudo antimísseis espacial de 175 bilhões de dólares, o mundo esperava um projeto que combinasse audácia e pragmatismo. Em vez disso, o que se vê é um espetáculo de rivalidades pessoais disfarçado de estratégia de defesa. Ao proclamar que Trump procura alternativas à SpaceX de Musk, o governo aponta para o Projeto Kuiper, da Amazon, como um potencial parceiro no programa. Mas a escolha de uma iniciativa que mal saiu do chão, liderada por Jeff Bezos — outro magnata que não desperta exatamente a simpatia de Trump —, levanta uma questão inevitável: seria isso uma jogada para fortalecer a segurança nacional ou apenas uma tentativa de acertar contas com Elon Musk, que ousou desafiá-lo com o “America Party”? Não é preciso ser um gênio — ou, como já se disse, ter um QI acima de 87 — para perceber o padrão. Líderes como Trump, e seus equivalentes em outros cantos do mundo, como Lula e Bolsonaro, têm uma notória inclinação por moldar decisões grandiosas ao sabor de rivalidades pessoais, é menos sobre segurança nacional e mais sobre enviar um recado claro: ninguém é indispensável, nem mesmo o homem que levou a humanidade mais perto de Marte.
O Projeto Kuiper, lançado pela Amazon em 2019, é uma aposta de mais de 10 bilhões de dólares para criar uma constelação de 3.236 satélites em órbita terrestre baixa (LEO), prometendo internet de banda larga rápida e acessível para comunidades desatendidas. Com aprovação da Comissão Federal de Comunicações (FCC) em 2020, o projeto opera em 98 planos orbitais, a altitudes de 590 km, 610 km e 630 km, utilizando links ópticos intersatélites (OISL) que transferem dados a 100 Gbps, formando uma rede em malha que, segundo a Amazon, supera cabos de fibra terrestres em velocidade para longas distâncias.
Equipados com o chip “Prometheus”, capaz de processar 1 terabit por segundo, os satélites do Kuiper ambicionam rivalizar com a Starlink da SpaceX. Mas ambição não é sinônimo de realização. Até julho de 2025, o Kuiper lançou apenas dois protótipos, em outubro de 2023, e 54 satélites de produção — 27 em abril de 2025, por um foguete Atlas V da United Launch Alliance (ULA), e 24 em julho de 2025, ironicamente, por um Falcon 9 da SpaceX.
A meta é iniciar testes beta no final de 2025, com serviço completo em 2026, desde que 578 satélites estejam em órbita até julho de 2026, conforme exigência da FCC. A Amazon garantiu 92 lançamentos com ULA, Arianespace e Blue Origin, além de três com a SpaceX, em um contrato que, apesar de grandioso, expõe uma dependência incômoda do próprio Musk para colocar seus satélites no espaço. Comparado aos mais de 9 mil satélites Starlink já operacionais, o Kuiper é um projeto embrionário, longe de oferecer a robustez necessária para um empreendimento como o Golden Dome.
A Política por Trás da Escolha

No papel, a inclusão do Kuiper no Golden Dome poderia ser justificada pela necessidade de diversificar fornecedores, reduzindo a dependência de uma única empresa para um projeto de defesa tão crítico. O Pentágono, segundo fontes, já vinha explorando alternativas à SpaceX antes do desentendimento público entre Trump e Musk, em 5 de junho de 2025, quando a rixa escalou com o lançamento do “America Party”, um movimento político de Musk que critica a agenda de Trump. Mas a urgência em empoderar o Kuiper, liderado por Rajeev Badyal — um ex-gerente da Starlink demitido por Musk —, sugere que a decisão é menos sobre estratégia e mais sobre o ego presidencial.
Como já se disse, até um observador casual, com o mínimo de ceticismo, perceberia o padrão: líderes como Trump, Lula ou Bolsonaro moldam decisões grandiosas para calar adversários e projetar poder, mesmo que isso custe bilhões ao contribuinte. Investir no Kuiper, que ainda engatinha, é uma aposta arriscada. O projeto enfrenta desafios técnicos significativos, como a necessidade de proteger seus satélites contra ataques cibernéticos e guerra eletrônica — um problema que até a SpaceX, com sua vasta experiência, considera “difícil”, conforme Musk admitiu em maio de 2024.
Enquanto a Amazon planeja lançar milhares de satélites, a SpaceX já opera uma constelação que atende às Forças Armadas americanas com comunicações seguras via Starlink e Starshield. Desviar 25 bilhões de dólares do primeiro aporte do Golden Dome para um sistema incipiente, enquanto a SpaceX entrega resultados concretos, parece menos uma estratégia de defesa e mais uma tentativa de Trump de mostrar que ninguém, nem mesmo Musk, é indispensável.
Custos e Consequências de Reinventar a Roda
O Congresso destinou 13 bilhões de dólares à Força Espacial para estimular a produção de satélites no setor privado, e o Golden Dome, com prazos apertados impostos ao general Michael Guetlein — 30, 60 e 120 dias para fases críticas —, reflete a pressa de Trump em marcar pontos políticos. Mas a escolha de concorrentes como o Kuiper, ou novatos como Stoke Space e Rocket Lab, ignora uma realidade inescapável: quando esses players alcançarem o nível atual da SpaceX, Musk já estará anos à frente, provavelmente planejando colônias em Marte enquanto o Pentágono lida com atrasos e orçamentos estourados.
A inclusão de gigantes tradicionais como Northrop Grumman, Lockheed Martin e L3Harris, que desenvolvem tecnologias de rastreamento e interceptores espaciais, é sensata, mas não justifica o desperdício de recursos em um projeto que ainda depende da SpaceX para seus próprios lançamentos.
Um Padrão Global de Personalismo
A decisão de Trump mostra claramente um padrão. Assim como Lula, que usou políticas públicas para reforçar sua imagem de benfeitor, ou Bolsonaro, que confrontou aliados para sustentar sua narrativa de outsider, Trump parece usar o Golden Dome como palco para uma disputa pessoal. Escolher o Kuiper, de Jeff Bezos — outro magnata com quem Trump tem histórico de animosidade —, é um movimento que cheira mais a xadrez político do que a planejamento estratégico. Enquanto o contribuinte americano paga a conta, o mundo observa um projeto que, embora ambicioso, pode ser comprometido por rivalidades que pouco têm a ver com a segurança nacional. O Golden Dome, em teoria, é uma resposta às crescentes ameaças globais, mas sua execução revela as prioridades de Trump: um líder que, como seus pares populistas, prefere o espetáculo do poder à eficiência da gestão. Resta saber se o Pentágono conseguirá transformar essa birra presidencial em um escudo funcional — ou se o contribuinte, mais uma vez, será o único a pagar o preço.