JCEDITORES – A prefeita de Boston, Michelle Wu, assinou uma ordem executiva com o objetivo de pressionar o governo do presidente Trump a divulgar as táticas de “polícia secreta” empregadas pelo Serviço de Imigração e Controle de Aduanas (ICE, na sigla em inglês) nas ações de repressão à imigração, tanto em Boston quanto em outras partes do país.
Na terça-feira, Wu anunciou que a cidade passará a solicitar regularmente documentos públicos ao Departamento de Segurança Interna (DHS) por meio da Lei de Liberdade de Informação, em resposta às táticas de “polícia secreta” que, segundo ela, têm sido usadas nas operações de controle migratório. A expressão “polícia secreta” refere-se a métodos considerados sigilosos ou opacos, nos quais agentes federais realizam prisões ou detenções sem transparência sobre suas ações ou identidade.
Wu destacou que Boston é uma cidade segura, com os menores índices de violência entre as grandes cidades dos Estados Unidos, incluindo taxas reduzidas de crimes violentos, homicídios e outros delitos graves, que estão em níveis historicamente baixos. “Isso resulta de décadas de parcerias e mudanças significativas para garantir que nossos policiais mantenham a confiança, a transparência e a responsabilidade conferidas pelos moradores de Boston”, afirmou. Ela enfatizou que os policiais locais usam distintivos visíveis e não utilizam máscaras regularmente, mantendo clareza sobre os motivos de eventuais prisões ou interações.
Acompanhada por autoridades municipais, estaduais e defensores comunitários na prefeitura, Wu informou que sua administração buscará registros que revelem quem está sendo preso, detido ou deportado pelas autoridades migratórias federais, além das justificativas para essas ações. Segundo ela, essas informações não têm sido fornecidas à cidade, que enfrenta tensões com o governo Trump devido ao seu status de “cidade santuário” – termo que designa localidades que limitam a cooperação com autoridades federais em questões de imigração.
Wu reconheceu que sua ordem executiva não tem força legal para obrigar o governo federal a atender às demandas da cidade por maior transparência nas operações de imigração. “O governo municipal não pode anular as ações do governo federal, mas é fundamental falar a verdade e deixar claro o que esperamos do governo federal”, declarou. Ela sugeriu que o responsável pela política de fronteiras, Tom Homan, e o ICE “façam uma pausa” (no original, “take a time out”), para reavaliar suas ações.
Wu também afirmou que “o povo americano não é ingênuo” e que “ninguém acredita na narrativa” de que essas táticas de “polícia secreta” tornam as comunidades mais seguras. Aqui, “ninguém está comprando essa história” (no original, “no one is buying the line”).
A ordem executiva por ela assinada surge após uma troca de críticas entre Wu e autoridades federais, incluindo a procuradora federal de Massachusetts, Leah Foley, o diretor interino do ICE, Todd Lyons, e a Casa Branca, depois que Wu descreveu os agentes do ICE como “polícia secreta” e, posteriormente, comparou o ICE a um grupo neonazista. A ação também ocorre em meio a operações do ICE em Los Angeles, onde manifestantes contrários à agência enfrentaram forças municipais, estaduais e federais após o presidente Trump declarar a cidade em estado de rebelião e mobilizar a Guarda Nacional.
Sindicatos e militantes locais realizaram um “comício emergencial” na praça da prefeitura de Boston na ultima segunda-feira para condenar as operações do ICE e a prisão do presidente de um sindicato local em Los Angeles. O governador da Califórnia também entrou com uma ação judicial contra o governo Trump, alegando que a federalização da Guarda Nacional do estado foi “ilegal”.
Wu criticou os agentes do ICE por “sequestrarem” pessoas nas ruas sem informar seu destino ou justificar as detenções. Em resposta, as autoridades federais afirmam que estão cumprindo a lei federal, identificam-se claramente e acusam Wu e outros políticos de colocarem os agentes do ICE em risco ao incitarem ativistas com seu “discurso inflamado”. A procuradora Foley destacou que os agentes usam máscaras para proteger sua identidade devido a ameaças, ataques e exposição pública (doxxing) sofridos por eles e suas famílias.
Ameaças a familiares e exposições de identidade de agentes da lei pelas redes sociais são comuns em areas dominadas pela Narco-Milicia no Brasil e em outras parte do mundo.
Análise da ação da prefeita Wu em Boston
A ordem executiva de Michelle Wu, que solicita registros públicos do ICE via Lei de Liberdade de Informação, segue o padrão dessas ações municipais. Exemplos concretos mostram que:
- Efeito prático limitado: Assim como em San Francisco, Chicago, Los Angeles e Nova York, a ação de Wu não tem força legal para obrigar o governo federal a divulgar informações ou alterar suas operações.
A Lei de Liberdade de Informação permite solicitações, mas o governo federal pode negar ou atrasar respostas, citando questões de segurança nacional. Dados históricos mostram que o ICE frequentemente retém informações detalhadas sobre operações, limitando a transparência. - Sinalização política: A ordem de Wu é, acima de tudo, uma sinalização política.
Ela reforça o status de Boston como “cidade santuário” e posiciona Wu como uma líder progressista em oposição às políticas de Trump. A presença de autoridades e ativistas no anúncio da ordem, bem como a retórica forte (comparando o ICE a “polícia secreta”), amplifica sua mensagem para mobilizar apoio local e nacional. Isso é semelhante às ações de Garcetti em Los Angeles ou de Blasio em Nova York, que usaram políticas locais para desafiar simbolicamente o governo federal. - Contexto de competência federal: A imigração é uma área de jurisdição exclusiva do governo federal, conforme estabelecido pela Constituição dos EUA e pela Lei de Imigração e Nacionalidade.
Cidades podem limitar a cooperação (como não compartilhar dados de prisões locais), mas não podem impedir o ICE de agir.
No caso de Wu, a solicitação de registros é uma tentativa de expor práticas do ICE, mas não impede suas operações, como visto nos exemplos de outras cidades. - Riscos e reações: A retórica de Wu, especialmente comparações polêmicas como a do ICE a grupos neonazistas, pode escalar tensões, como ocorreu em Los Angeles com protestos contra o ICE.
A resposta federal, como a de Leah Foley, sugere que tais ações municipais podem aumentar riscos para agentes do ICE, mas também polarizam o debate, fortalecendo a base política de Wu entre progressistas.