FOLHAPRESS (
– A cada dia de maio, em média, 165 brasileiros foram barrados ao tentar entrar nos EUA de modo irregular, via México, mantendo uma tendência de alta que ganha força desde março. O total de apreensões no mês passado, 5.118, foi quase quatro vezes maior do que o de março (1.346), mas abaixo dos 10.471 registrados em setembro do ano passado, segundo o CBP (Departamento de Controle de Fronteiras).“A justificativa que a gente mais escuta nas entrevistas com imigrantes brasileiros que chegam aos EUA é a economia brasileira, devido à alta da inflação e à estagnação dos salários“, afirma Gabrielle Oliveira, professora na Universidade Harvard e pesquisadora de imigração. “Muitos deles dizem não ver perspectiva de melhora no Brasil, independentemente de quem for eleito presidente em outubro.”
O aumento de brasileiros detidos é parte de um recorde de imigrantes que tentam entrar nos EUA. O total de barrados na fronteira tem ficado acima de 200 mil por mês desde março. Em maio, atingiu 239 mil, a maior cifra mensal já registrada –o dobro do que se via em 2021. Essa alta tem várias razões: se muitos países da América Latina enfrentam crises econômicas, os EUA têm vagas de trabalho sobrando; outro ponto é a percepção de que Joe Biden seria mais tolerante com a imigração do que Donald Trump.
Para Oliveira, o caso divulgado na segunda (27), quando ao menos 51 pessoas, provavelmente imigrantes em situação irregular, foram encontradas mortas dentro e ao redor de um caminhão em San Antonio, no Texas, mostra que a fronteira continua bastante difícil de cruzar, mesmo sob comando democrata.
“Quanto mais vigiada estiver a fronteira, mais gente buscará esse tipo de entrada, super arriscada. As pessoas estão chegando [à fronteira] e sendo recusadas, o que aumenta o desespero para entrar. Veremos mais gente escondida em veículos, morrendo por desidratação e altas temperaturas”, diz a pesquisadora.
Felipe Alexandre, advogado do escritório AG Immigration, por outro lado, afirma que as condições ficaram um pouco melhores sob o governo Biden. “Temos visto mudanças nos tribunais de imigração. Agora, os promotores têm mais poder para ajudar, como concordar em juízo com a defesa do imigrante [para que ele fique no país]. Antes, eles estavam com as mãos totalmente amarradas.”
O governo Trump, que fazia do combate à imigração irregular uma bandeira, criou medidas para dificultar a entrada de estrangeiros. Muitas delas seguem em vigor, como a Título 42, que permite a agentes barrar pedidos de asilo na fronteira e mandar os requerentes embora para esperar o resultado da solicitação em outro país, sob a justificativa de risco à saúde pública. A regra foi criada em meio à pandemia de Covid.
A lei americana autoriza estrangeiros a pedir asilo aos EUA caso sofram perseguições em seus países, por razões políticas, religiosas, de nacionalidade e etnia, mas o modo de lidar com essas solicitações pode variar muito. Se o viajante chegar ao posto de fronteira e pedir asilo, provavelmente será orientado a aguardar a resposta no México, como parte dos procedimentos da medida Título 42.
Caso o estrangeiro cruze a fronteira de modo irregular e se entregue já em solo americano, o agente que fizer a captura tem poder para decidir se encaminha o imigrante para deportação ou a uma corte que analisará o pedido de asilo. “Vai muito de qual agente a pessoa encontrou naquele dia”, diz Alexandre.
Se as autoridades de imigração aceitarem abrir um processo de análise de asilo, os estrangeiros podem ficar nos EUA enquanto aguardam a resposta, que leva em média entre seis a oito anos para ser dada. No período de espera, os imigrantes podem pedir autorização de trabalho depois de alguns meses e, assim, começarem a se estabelecer no país enquanto aguardam a resposta final.
Uma medida debatida pela gestão Biden é acelerar o trâmite dos processos de asilo, de modo a dar a resposta em menos de um ano. Assim, haveria chances menores de o requerente permanecer por anos no país, o que desestimularia migrações de quem não se encaixa nas categorias de asilo.
No entanto, especialistas apontam que o debate dessas medidas podem ser gatilhos para estimular a migração, por medo de que alterações nas regras tornem o processo mais difícil no futuro.