
Boston, Massachusetts – Em um movimento que reacende o debate sobre os impactos da legalização da maconha, duas propostas de referendo apresentadas no estado de Massachusetts buscam proibir as vendas legais de cannabis para uso recreativo, mantendo apenas o comércio regulado para fins medicinais. As iniciativas, lideradas por Caroline Cunningham, que já se opôs à legalização de psicodélicos, enfrentam um longo caminho até as urnas de 2026, mas expõem uma discussão mais profunda: seria a maconha recreativa uma porta de entrada para substâncias mais perigosas?
As propostas, intituladas “Ato para Restaurar uma Política Sensata sobre Maconha”, permitem a posse de até 28 gramas de maconha (ou 5 gramas de concentrados) por adultos acima de 21 anos e autorizam doações sem fins lucrativos, mas revogam a legalização das vendas recreativas e do cultivo doméstico, aprovada por 54% dos eleitores em 2016.
Uma das versões também impõe limites de potência na cannabis medicinal, restringindo a flor a 30% de THC e concentrados a 60%, além de proibir produtos com doses superiores a 5 mg de THC.
Como jornalista que há décadas observa o impacto das drogas na sociedade, vejo com ceticismo a narrativa de que a legalização da maconha é inofensiva. A cannabis, embora menos letal que opioides ou crack, frequentemente atua como uma droga de entrada, um degrau inicial que normaliza o uso de substâncias psicoativas e pode levar ao consumo de drogas mais nocivas.
Estudos, como os do National Institute on Drug Abuse (NIDA), sugerem que o uso precoce de maconha aumenta a probabilidade de experimentação com outras substâncias, especialmente entre jovens, cujos cérebros ainda em desenvolvimento são mais vulneráveis. Em Massachusetts, onde 65% da população apoia a legalização, segundo pesquisa do MassINC Polling Group de abril de 2024, esse risco é frequentemente ignorado em nome da liberdade individual e dos lucros da indústria canábica.
A própria Comissão de Controle de Cannabis de Massachusetts enfrenta críticas por falhas na regulação. Na última semana, a agência revelou que mais de 500 produtos no mercado estavam contaminados por mofo ou leveduras, um sinal alarmante de que a fiscalização não protege suficientemente a saúde pública. Steve Reilly, da operadora licenciada Insa, defende a legalização, argumentando que os problemas são regulatórios, não estruturais, e que proibir as vendas legais abriria espaço para o mercado informal.
Mas será que regulamentar uma droga que facilita o acesso a outras é realmente a solução? O mercado ilegal, que as propostas poderiam inadvertidamente fortalecer, já opera à margem da lei, mas a legalização não eliminou o crime organizado — apenas o integrou a uma fachada de legitimidade.
As propostas enfrentam barreiras significativas: precisam da aprovação da Procuradoria-Geral até 3 de setembro, seguida da coleta de 75.574 assinaturas até 3 de dezembro, conforme reportado pelo Telegram & Gazette. Se validadas, ainda exigirão mais 12.429 assinaturas até julho de 2026 para chegar às urnas. Mesmo assim, o debate que elas suscitam é urgente. A maconha recreativa, vendida como inofensiva, mascara um risco social maior: ao normalizar o uso de drogas, abrimos a porta para dependências mais graves, especialmente em comunidades vulneráveis, onde o acesso a substâncias ilegais é mais fácil do que a presença de políticas públicas eficazes.
Enquanto Massachusetts decide o futuro de sua indústria canábica, é preciso questionar: estamos regulando um mercado ou pavimentando o caminho para uma crise maior? A resposta não está nas urnas, mas nas ruas, onde os efeitos das drogas, legais ou não, continuam a moldar histórias de destruição.


