JUNOT (OPINIÃO) – No Reality Show que se reformou a politica da América, onde cada personagem revela o grotesco e o sublime, Donald Trump, esse histrião de bronzeado eterno, aponta seu dedo acusador para Harvard, a Meca do intelecto que virou, segundo ele, um ninho de antissemitismo e doutrinação esquerdista. Sera que ele estaria certo em ou errado nessas alegações? Trump é um mestre em transformar verdades parciais em cruzadas do fim do mudo e entre sua retórica, há uma verdade incômoda: algo está podre no reino das universidades de elite, e Harvard, com seu fundo bilionário e sua aura de infalibilidade, parece que tonou-se o epicentro de uma crise moral.
Repostas Evasivas
Vamos relembrar alguns fatos. Dezembro de 2023. O Congresso americano, esse circo de indignações seletivas, convoca Claudine Gay, então presidente de Harvard, para explicar o que está acontecendo no campus. A questão é direta: manifestações de estudantes que, segundo acusações, pedem o “genocídio do povo judeu” violam ou não as regras de assédio da universidade? Gay, com a frieza de quem calcula cada sílaba, responde: “Podem ser, dependendo do contexto.” Silêncio. O mundo ouve o som de uma reputação implodindo.
Dependendo do contexto? Então, imagine a cena: um estudante grita por “intifada global” ou “do rio ao mar”, slogans que, para muitos, ecoam a destruição de Israel e, por extensão, dos judeus. E a líder de Harvard, em vez de condenar com a clareza, oferece uma resposta que é um malabarismo verbal, uma pirueta acadêmica. Para os opositores de Gay, a frase foi mais que evasiva — foi cúmplice. Justificar um genocídio depende de contexto? Que contexto seria esse? Durante um piquenique em Cambridge? Um debate sobre Kant? Num jantar para “inteligentinhos”?
A resposta de Gay foi “obscena” — não por falta de decoro, mas por sua covardia moral.
E então, na sequencia daqueles acontecimento, Claudine Gay cai. Não pelo antissemitismo, mas por plágio. Acusada de copiar trechos de trabalhos acadêmicos, ela renuncia em janeiro de 2024, deixando Harvard em um vácuo de liderança. O plágio, claro, é um pecado mortal na academia, mas o que realmente selou seu destino foi a percepção de que ela representava uma elite acadêmica desconectada, incapaz de enfrentar o monstro do antissemitismo que, segundo Trump e seus aliados, floresce nos campi como erva daninha ou como aquela que se enrola em papal para fumar.
Antissemitismo?
Trump, com sua habitual falta de sutileza, pinta Harvard como um covil de ódio antijudaico, onde protestos pró-Palestina se transformam em celebrações do Hamas. Exagero? Talvez. Mas não é segredo que algumas das melhores universidades americanas adotaram posturas que, no mínimo, flertam com a ambiguidade moral.
Os protestos de 2024, que varreram os campi em apoio à causa palestina, muitas vezes cruzaram a linha do discurso político para o assédio. Estudantes judeus relataram intimidação, aulas interrompidas, slogans que evocam violência. E o que fez Harvard? Segundo críticos, pouco. Muito pouco.
Para muitos, Harvard se tornou um “clube de intelectuais que confundem liberdade de expressão com licença para odiar”, onde o antissemitismo se veste de justiça social para parecer respeitável. Não se trata de negar o direito de criticar Israel — crítica não é sinônimo de ódio. Mas quando “do rio ao mar” vira um grito de guerra e estudantes judeus se sentem acuados, algo está fora de ordem. E Trump, com seu instinto para o espetáculo grotesco que conduziu a um segundo mandato, farejou ali um campo fértil para sinalizar supostas virtudes.
O presidente exige que Harvard combata esse antissemitismo com punho de ferro: auditorias externas, punições a manifestantes, colaboração com o Departamento de Segurança Nacional. É uma abordagem draconiana, típica de quem vê o mundo como um ringue de luta livre. Mas, sejamos justos: a leniência de Harvard com certos excessos criou um vácuo que Trump agora explora e capitaliza a seu favor.
Quando uma universidade permite que o discurso de ódio se disfarce de ativismo, ela não apenas falha com seus estudantes judeus — ela falha com a própria ideia de educação.
O Fim do Mérito?
E então chegamos a um outro pilar das acusações de Trump: as políticas de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI). Para Trump, essas políticas são o veneno que corrói a excelência acadêmica. Harvard, em sua busca por uma utopia igualitária, teria abandonado o mérito em favor de cotas disfarçadas, onde raça, gênero e origem pesam mais que talento, esforço ou inteligência. E aqui Trump toca numa ferida aberta.
As universidades deveriam ser templos do mérito, onde o filho de um operário de Ohio ou de um motorista que ganha a vida operando por aplicativos do Bronx pudesse, com suor e genialidade, conquistar um lugar ao sol. Mas as políticas DEI, segundo os críticos, inverteram a lógica: em vez de premiar a capacidade individual, elas priorizam a representação demográfica. E quem paga o preço? O filho do cidadão pobre, aquele que não se encaixa nas caixinhas identitárias do momento.
Um jovem branco de classe trabalhadora, ou um asiático que estudou até a exaustão, pode ser preterido porque não “diversifica” o campus. É a ironia suprema: em nome da inclusão, exclui-se.
Eu pessoalmente suponho que DEI seja um tipo de peça teatral pseudoprogressista, onde a mediocridade se veste de virtude para humilhar o talento e glorificar a vitimização.
Trump, por sua vez, simplesmente exige que Harvard volte a premiar o mérito. E, por mais que sua retórica seja tosca, desagradável, barulhenta e que de longe cheira mal, ele ecoa um sentimento real: as universidades estão se afastando da excelência em nome de uma engenharia social que, no fim, não satisfaz ninguém.
Os Tsarnaev e a Ingratidão dos Privilegiados
Vamos a visitação de um passado sombrio: os irmãos Tsarnaev. Lembram-se deles? Imigrantes da Chechênia, acolhidos pelos Estados Unidos, bolsistas de universidades em Massachusetts, beneficiados por uma sociedade que lhes abriu as portas. E o que fizeram? Em 2013, na Maratona de Boston, plantaram bombas na linha de chegada, matando três pessoas e ferindo centenas. Um ato de terrorismo que chocou o mundo. E o que nos diz essa história? Que o privilégio acadêmico, o acesso à educação de elite, não garante gratidão nem civilidade.
Trump usa casos como esse — implícita ou explicitamente — para justificar sua cruzada contra as universidades. Se Harvard e suas irmãs abrem as portas para estudantes estrangeiros, muitas vezes com bolsas generosas, e esses mesmos estudantes (ou seus pares) se voltam contra os “valores americanos”, então algo está errado. Não se trata de demonizar imigrantes, mas de questionar: “por que as universidades parecem incapazes de incutir nos seus alunos um senso de responsabilidade cívica? Por que, em vez de gratidão, alguns respondem com radicalismo?”. Que os doutores de Harvard responda, seria um bom começo para um dialogo produtivo.
A Crise Moral das Universidades
Mesmo aqueles que torcem o nariz para Trump e veem nele a materialização de uma das tríade demoníaca, devem, em nome da honestidade, admitir: as universidades americanas estão em crise. Não é só Harvard. É Columbia, Princeton, Yale. É o culto à ideologia acima da razão, a tolerância com o intolerável, a confusão entre liberdade de expressão e apologia à violência.
Quando uma presidente de universidade hesita em condenar chamados ao genocídio, quando políticas de admissão sacrificam o mérito no altar da diversidade, quando campi se tornam palcos de ódio disfarçado de ativismo, algo está fora de ordem.
Trump, em seu oportunismo sinaliza uma indignação, se genuína ou dissimula, viu uma chance para se passar por agente do bem. Ao atacar Harvard, ele não apenas acerta contas com uma elite que o despreza — ele mobiliza milhões de americanos que se sentem traídos por instituições que deveriam representar o melhor do país.
Congelar US$ 2,2 bilhões em fundos federais? Exigir auditorias e vigilância? São medidas autoritárias, sem dúvida. Mas elas encontram eco porque Harvard, com sua arrogância olímpica, falhou em se defender.
Redenção
No fim, o que Trump quer é mais que uma reforma — é uma rendição. Ele quer Harvard de joelhos, renunciando ao DEI, punindo manifestantes, alinhando-se aos “valores americanos” (leia-se: os valores de Trump). É um ultimato que Harvard, com razão, rejeita, invocando a Primeira Emenda e a autonomia acadêmica. Mas a universidade não pode se esconder atrás de princípios enquanto ignora suas falhas. O antissemitismo nos campi é real. A erosão do mérito é real. A desconexão com o americano comum é real.
Harvard se perdeu em sua própria soberba, achando que o mundo gira em torno de Cambridge. As universidades de um modo geral, que trocaram a busca pela verdade por uma pantomima ideológica. Trump pode ser o mensageiro errado, mas a mensagem não é de todo falsa. Harvard precisa se olhar no espelho. Não para ceder a Trump, mas para salvar a si mesma.


